Título: PF prende diretores do Ibama em quadrilha de extração de madeira
Autor: Lígia Formenti e Vasconcelo Quadros
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/06/2005, Nacional, p. A4

A maior quadrilha especializada na extração ilegal e venda de madeira na Amazônia começou a ser desmontada ontem pela Polícia Federal, numa operação batizada de Curupira. Entre acusados de participar do esquema estão vários integrantes do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama), incluindo o diretor de Florestas, Antonio Carlos Hummel, e o gerente-executivo do Ibama em Cuiabá, Hugo José Werle. Depois de passar o dia foragido, Hummel foi preso. Até o início da noite, 87 pessoas já haviam sido presas na operação, tida como a maior já realizada pela Polícia Federal na Amazônia. O presidente da Fundação Estadual do Meio Ambiente (Fema) do Mato Grosso, Moacir Pires, também foi preso.

Para desbaratar o esquema, a Justiça decretou a prisão temporária de 124 pessoas, entre despachantes, integrantes do Ibama e empresários, e 168 mandados de busca e apreensão. Durante a operação, dois carros importados, um avião, uma lancha e R$ 140 mil foram apreendidos.

As investigações do esquema de corrupção e fraude começaram a ser feitas há nove meses pela Polícia Federal, Ministério do Meio Ambiente e Ministério Público Federal. Até ontem, a lista de envolvidos era de 89 pessoas. O Ministério Público, porém, acrescentou mais 40 nomes à relação. Entre eles, o de Hummel.

As fraudes tinham como ponto de partida a extração ilegal de madeira no Mato Grosso. Para "esquentar" o produto depositado nas madeireiras, Autorizações para Transporte de Produtos Florestais (ATPFs) eram falsificadas. O documento, feito pela Casa da Moeda, é usado como instrumento de fiscalização pelo Ibama e como uma espécie de certificado de origem da madeira.

O vice-presidente do Ibama, Luiz Fernando Nerico, informou que havia várias formas de fraude de ATPFs. Desde preenchimento incorreto das vias até a "reciclagem": depois de usada, era submetida a uma lavagem com produtos químicos e depois novamente preenchida, como se fosse nova. Segundo a Polícia Federal, uma ATPF em branco era comercializada ao custo de R$ 2 mil. Para facilitar a operação, 431 empresas fantasmas foram criadas.

Pelos cálculos feitos até agora, o volume de madeira transportado ilegalmente pela quadrilha seria suficiente para carregar 76 mil caminhões que, enfileirados, cobririam a distância entre o Rio e Brasília. A derrubada ilegal de madeira, que a quadrilha começou a praticar em 1990, abriu nas florestas de Mato Grosso uma clareira equivalente a 43 mil hectares , o que corresponde a 52 mil campos de futebol. A carga é avaliada em R$ 890 milhões. Para promover a recomposição da área devastada, o governo teria de investir cerca de R$ 108 milhões.

Werle e seu substituto no Ibama do Mato Grosso foram presos sob a acusação de corrupção passiva e enriquecimento ilícito. Dados reunidos pela Polícia Federal demonstram que Werle conseguiu aumentar seu patrimônio em R$ 426 mil durante os dois anos que esteve no cargo. A Polícia Federal também interditou três madeireiras que atuavam na região: Sulmap, Ancacil e Madeplacas. As duas primeiras são multinacionais e enviariam a madeira derrubada ilegalmente para a China.

A Polícia Federal informou que mandados de prisão deveriam ser cumpridos também no Distrito Federal, Rondônia, Acre e Santa Catarina.

Levantamento feito pelo Ministério do Meio Ambiente mostra que o Estado do Mato Grosso foi responsável por 48% do total de desmatamento registrado entre 2003 e 2004. Dos 26,14 hectares desmatados em toda a Amazônia, 12,5 foram registrados no Mato Grosso. Esse índice representa um aumento de 20% em relação ao ano anterior.