Título: Brasil avaliará construção de um gasoduto até o Peru
Autor: José Ramos
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/06/2005, Economia, p. B6

Os governos de Brasil, Argentina, Chile e Uruguai devem assinar na próxima terça-feira um acordo para estudar a construção de um gasoduto que trará o gás natural da Bacia de Camisea, no Peru, para os quatro países. Segundo informou ao Estado a ministra de Minas e Energia, Dilma Rousseff, a proposta foi apresentada conjuntamente pelo Chile e pela Argentina na última quinta-feira, em Brasília, e despertou grande interesse no governo brasileiro. "A grande vantagem dessa proposta é que ela acaba com a crise do gás no Cone Sul, porque hoje existe concretamente uma crise do gás na Argentina e no Chile, que de certa forma afeta o Brasil", explicou a ministra. Ela reconheceu que o novo gasoduto também reduziria a vulnerabilidade do Brasil em relação ao gás da Bolívia, onde a exploração por empresas estrangeiras está sendo contestada por movimentos populares. "Em qualquer sistema, sempre que há diversificação de fontes de suprimento, o sistema se torna mais robusto, mais confiável , mais sólido", avaliou.

Os quatro países ainda vão analisar os custos da proposta, mas Dilma acredita que todo o projeto não passará de US$ 2,5 bilhões. Neste custo, estariam incluídos os US$ 300 milhões do gasoduto Uruguaiana-Porto Alegre, antigo projeto brasileiro que seria viabilizado com o gás peruano, passando pela Argentina.

O Brasil poderá participar por meio de consórcio envolvendo a Petrobrás e empresas privadas interessadas. Segundo Dilma, não seria obrigatória a liderança da Petrobrás no consórcio, mas os chilenos e argentinos fazem questão de que a estatal participe do empreendimento. Eles também querem que o acordo para o projeto seja aprovado pelos governos e pelos parlamentos dos quatro países, para que haja mais segurança jurídica.

CRISE

O principal alvo do projeto é a crise de abastecimento de gás que afeta Argentina e Chile. Na Argentina, o consumo de gás é alto porque os preços estão congelados e boa parte dos automóveis é movida a gás. Mas o controle do preço inibiu investimentos. Assim, a produção não acompanhou o crescimento do consumo. Hoje, a Argentina não consegue cumprir os compromissos de exportação de gás ao Chile. Por isso, a entrada do gás peruano aliviaria a situação.

Dilma explicou que os dois gasodutos que ligam a Argentina ao Chile - Atacama e Nor-Andina - têm capacidade para transportar até 17 milhões de metros cúbicos diários. Mas, com a falta de gás na Argentina desde 2003, o país está exportando para os chilenos apenas 5 milhões de metros cúbicos. Com o projeto do Mercosul, os peruanos poderiam despachar para o Chile de 30 milhões a 35 milhões de metros cúbicos diários, dos quais 17 milhões poderiam descer para a Argentina, aproveitando a rede atual.

O efeito seria um ganho líquido de 22 milhões de metros cúbicos diários para a Argentina, pouco menos do que o Brasil importa hoje da Bolívia. E, com o investimento dos quatro países, a malha poderia ser ampliada de 17 milhões de metros cúbicos para 20 milhões a 30 milhões de metros cúbicos. O Brasil teria direito a um suprimento de 5 milhões a 7 milhões de metros cúbicos - a mesma quantidade prevista inicialmente para o gasoduto Uruguaiana-Porto Alegre.

Segundo Dilma, a diversificação de fontes de gás na América do Sul é estratégica para o Brasil. "O mercado que começa a ficar maduro em uma região é um mercado de interconexão. Se tiver várias fontes de suprimento, se tiver uma infra-estrutura estável, cria-se uma situação muito mais previsível, muito menos arriscada para todo mundo."

Com isso, segundo a ministra, haverá mais segurança até para o mercado do gás produzido no território brasileiro: "Isso fortalece o mercado de gás no Brasil, porque estabiliza o mercado de gás nos nossos vizinhos. Quanto mais gás, mais os consumidores estarão protegidos contra qualquer risco".