Título: Inadimplência é a maior em 4 anos
Autor: Márcia De Chiara
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/06/2005, Economia, p. B1

A inadimplência do consumidor atingiu em abril deste ano a maior marca dos últimos quatro anos, segundo o Indicador Serasa de Inadimplência. O número acendeu o sinal de alerta sobre a capacidade do brasileiro de quitar as dívidas em dia nos próximos meses. Tanto é que já há lojas mudando critérios de aprovação de crédito para reverter o risco de calote. Além dos juros altos e dos prazos alongados dos financiamentos, existe agora um novo foco de preocupação: a desaceleração do ritmo da economia, que ficou clara com o resultado do Produto Interno Bruto (PIB) do primeiro trimestre. Esse é um cenário da atividade diferente do inicialmente previsto pelas lojas, bancos e financeiras, que poderá ter impacto no emprego e na renda a médio prazo, complicando o quadro da inadimplência.

Em abril, o índice dessazonalizado de inadimplência do consumidor, que elimina as influências típicas de cada época do ano, alcançou no acumulado em 12 meses a marca de 184,80 pontos, segundo o Indicador Serasa de Inadimplência. O movimento de alta do indicador começou em outubro, quando o índice atingiu 173,80 pontos depois de ficar estável por quase um ano, exatamente um mês após a elevação da taxa da básica de juros. Esse termômetro da inadimplência considera o fluxo de dívidas não pagas a financeiras, redes varejistas, administradoras de cartões de crédito, bancos, cheques sem fundos e títulos protestados.

Também para as empresas o indicador de inadimplência, dessazonalizado e acumulado em 12 meses, fechou em alta em abril, com 131,22 pontos. O índice está em trajetória ascendente desde janeiro deste ano, quando estava em 127,31. O diretor de produtos da Serasa, Laércio de Oliveira, observa que, desde janeiro de 2004, a inadimplência das empresas vinha apresentando quedas sucessivas, comportamento coerente com o cenário de crescimento econômico do período, e agora houve uma inversão de tendência.

Outro indicador confirma a persistência da alta da inadimplência do consumidor no mês passado. Segundo a Associação Comercial de São Paulo (ACSP), a inadimplência líquida (saldo entre os carnês com prestações atrasadas e os crediários renegociados comparado com as vendas a prazo de três meses anteriores) atingiu em maio deste ano 7,4%. Foi o maior nível de inadimplência para um mês de maio desde 2002.

"A perspectiva de alta da inadimplência exige cautela, mas não significa uma explosão", pondera Oliveira, da Serasa. Essa avaliação é compartilhada pelo economista da ACSP, Emílio Alfieri, que confirma o sinal de alerta. Ele destaca também que, pelo segundo mês consecutivo, em maio o ritmo de crescimento do número de carnês em atraso superou o dos crediários inadimplentes que foram renegociados.

Entre os fatores que contribuíram para aumentar o calote, Oliveira destaca o desemprego, ainda elevado, associado à renda quase estagnada. Também a maior oferta de crédito facilitou o endividamento. Números do Banco Central (BC) mostram que o saldo de empréstimos concedidos a consumidores somou R$ 129,89 bilhões em abril, com crescimento nominal no ano de 14,7% e de 35,9% acumulados em 12 meses.

A maior expansão nos volumes foi verificada no crédito consignado - empréstimo vinculado ao desconto na folha de pagamento. Em abril, o saldo do crédito consignado atingiu R$ 16,54 bilhões. Neste ano, acumula crescimento de 31,2% e uma alta nominal de 110,9% em 12 meses.

Segundo o vice-presidente da Associação dos Executivos de Finanças, Contabilidade e Administração (Anefac), Miguel Ribeiro de Oliveira, mesmo o crédito consignado tem um risco de inadimplência. Se a economia continuar desacelerando e o consumidor que levantou dinheiro nessa linha de crédito for demitido, até 30% da verba rescisória será destinada à quitação do débito.

Oliveira, da Serasa, lembra também que o aumento do crédito consignado é positivo para reduzir as taxas de juros e resolver o problema de inadimplência de outras carteiras. Ocorre, no entanto, que se o financiamento for tomada de forma irracional pode provocar o aumento da inadimplência de outros financiamentos, porque o trabalhador terá renda líquida mensal menor. É que o valor da prestação a ser paga já é descontado do salário na fonte.