Título: Ação da PF vira vitrine contra CPI dos Correios
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Fonte: O Estado de São Paulo, 05/06/2005, Nacional, p. A4

Ministro da Justiça, entretanto, diz que operações já estavam planejadas

BRASÍLIA - Pressionado pelo acúmulo de denúncias de corrupção, o governo vai intensificar o combate à roubalheira em órgãos públicos para tentar se antecipar aos trabalhos da CPI dos Correios. O objetivo é demonstrar que não há tolerância com casos como o dos Correios e o do Instituto de Resseguros do Brasil (IRB), estatais apontadas como fonte de recursos irregulares para caixinhas de políticos. O ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos admite que a onda de denúncias na área política influenciou as posições do governo, mas afirma que o combate à corrupção já vinha sendo estruturado havia muito tempo: "Desde o primeiro dia de governo tenho carta branca do presidente Lula para agir sem interferência política. A Polícia Federal não persegue nem protege ninguém".

Um caso citado por Bastos é o ex-gerente executivo do Ibama em Cuiabá Hugo José Scheuer Werle, preso na quinta-feira durante a operação que desmantelou a maior quadrilha envolvida na derrubada ilegal de florestas. "Hugo é do PT. Era um quadro razoavelmente qualificado dentro do partido", lembra o ministro, antes de frisar que os policiais federais nem sequer deram bola para os apelos do petista. Membro da executiva estadual do PT em Mato Grosso, Werle - quando percebeu que seria detido - pediu para ser levado com discrição. O delegado Tardelli Boaventura Cerqueira determinou, no entanto, que fosse algemado e chegasse à prisão pela porta da frente.

A ofensiva do governo está amparada, segundo o ministro, numa estratégia que conta com a integração de diversos órgãos federais de repressão. "Não há obstáculo político", sustenta o ministro, que aposta numa assepsia das áreas infectadas por corrupção pública a partir das investigações dos Correios e do IRB.

O organograma dos órgãos de repressão é encabeçado pela Polícia Federal, cujas ações costumam chamar mais a atenção. Mas há também as atividades de organismos como o Banco Central, a Receita Federal, a Controladoria-Geral da União, a Secretaria de Desenvolvimento Econômico e o Departamento de Recuperação de Ativos e Recuperação Jurídica Internacional - setor do Ministério da Justiça especializado na luta contra a lavagem de dinheiro e apto a repatriar dinheiro enviado para o exterior.

LICITAÇÕES

O principal foco de corrupção na estrutura federal, diz Bastos, já está detectado: são as chamadas comissões de licitação, que decidem quais empresas podem vender produtos e serviços ao governo. "Já tiramos uma grande lição. Deve haver rotatividade nas comissões", sugere o ministro, que defende uma permanência de até seis meses para cada membro, em qualquer setor do governo federal. O ministro acha que a redução dos índices de corrupção deve contar com a integração dos órgãos federais e a "criação de uma cultura de combate aos criminosos que se organizam para praticar corrupção".

Principal aliado do ministro, o diretor-geral da Polícia Federal, Paulo Lacerda, diz que a nova estratégia é usar inteligência e paciência para apanhar toda a organização criminosa e não apenas uma ponta do esquema. "Quem estiver roubando que continue roubando", diz Lacerda. A sensação de impunidade, segundo ele, deve ser usada para reunir as provas que permitam o desmantelamento do grupo.

Lacerda garante que a polícia irá fundo nos casos dos Correios e do IRB. "Nada deixará de ser investigado. Mas vamos cuidar caso a caso."

O ministro garante que nunca se combateu tanto o crime a corrupção no País. E cita números: das 75 operações da Polícia Federal de agosto de 2003 a maio deste ano, 45 se voltaram para os criminosos de colarinho-branco e apresentaram um saldo de 819 presos, dos quais, 247 são servidores levados à cadeia pela Polícia Federal. No total foram 1.234 presos no período e, destes, 120 policiais federais e rodoviários, apanhados em flagrante pela própria corporação.

O maior exemplo de que a polícia não teve dificuldades em cortar na própria carne, segundo os dados do Ministério da Justiça, está no número de agentes e delegados que, depois do processo transitar em julgado, foram demitidos a bem do serviço público: 13 em 2003 e 18 no ano passado. O único dado disponível para uma comparação com o governo anterior é a estatística de 2002, que apresenta a demissão de dois policiais.

"É falsa a percepção de que a corrupção está aumentando. O que aumentou foi a repressão", argumenta. Os números mínguam, no entanto, quando se trata de prender suspeitos engravatados ou personagens que vivem à sombra dos partidos que integram a base aliada do governo.