Título: Na ponta do laço e dos cascos, bancada gaúcha vota unida
Autor: Gilse Guedes
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/06/2005, Nacional, p. A9

Vistos como bairristas e aguerridos, os parlamentares gaúchos formam a bancada das causas inglórias. Deixam de lado diferenças ideológicas e rivalidades eleitorais para batalhas "em defesa do Rio Grande do Sul" e não têm medo de encarar temas controversos. Defendem sem constrangimento os produtores de fumo e de armas, vão para briga pela liberação dos transgênicos e lutam para que o governo socorra a Varig. Os gaúchos formam uma bancada com 31 dos 513 deputados e três dos 81 senadores. Não assim tão numerosos, mas a insistência desses congressistas na defesa das "bandeiras do Estado" ajuda a produzir resultados. Eles saíram vitoriosos, por exemplo, do confronto com ambientalistas e aliados da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, para a legalização do cultivo de organismos geneticamente modificados. Naturalmente que o projeto dos transgênicos não foi aprovado apenas pelo empenho de congressistas do Rio Grande do Sul. Mas o barulho que eles fizeram contribuiu para a decisão.

O que diferencia a bancada gaúcha, na visão do senador Paulo Paim (PT-RS), é que os parlamentares do Sul atuam no Congresso sem olhar para diferenças partidárias. "Eu e os senadores Pedro Simon, do PMDB, e Sérgio Zambiasi, do PTB, somos de partidos diferentes, mas votamos muitas vezes unidos em defesa do Rio Grande do Sul. A tendência é caminhar sempre juntos. E, mesmo que as visões sejam diferentes por questões partidárias, defendemos a posição um do outro", explica Paim.

"Somos assim. Como se diz, unidos no lombo do cavalo, na ponta do laço e na ponta dos cascos. Isso em nome dos interesses do Rio Grande", prossegue o senador petista. "Para entender as características da bancada gaúcha, é preciso compreender a história do nosso Estado. Isso vem de muito longe. É só olhar para a história, a guerra dos Farrapos...." No Senado, Paim é relator, na Comissão de Assuntos Sociais, da Convenção-Quadro para Controle do Tabaco, um tratado proposto pela Organização Mundial de Saúde (OMS) para gradativamente acabar com a produção mundial de fumo. Na semana passada, marcada pelo Dia Mundial do Controle do Tabaco, o ministro da Saúde, Humberto Costa, do mesmo partido de Paim, esteve no Congresso para pedir pressa na aprovação da convenção. O senador, porém, quer que o assunto seja exaustivamente discutido para se fechar um acordo para votar a convenção.

Paim diz que não é contra a aprovação da convenção, mas diz que a proposta tem de detalhar, de forma clara, como será a regra de transição para a substituição do fumo por outra cultura. "Estão envolvidas na produção do fumo no Sul 250 mil famílias. Não podemos fechar os olhos para isso. É claro que ninguém acredita que o fumo não faz mal. Mas essas famílias vão viver como? Temos de definir como e qual será a cultura que substituirá o fumo", argumenta.

Na Câmara, o deputado Pompeo de Mattos (PDT-RS) não se constrange em sair em defesa das "causas do Sul". Integrante da CPI das Armas, já foi identificado como integrante da "bancada da bala" por repetir que a proibição da venda de armas e munições será um golpe na indústria gaúcha que produz, em larga escala, revólveres e balas de fogo. Chega a defender até mesmo que o referendo previsto para outubro, quando a população opinará se quer o fim da venda de armas e munições no País, seja feito regionalmente.

"O plebiscito pode ser realizado, mas deve ser respeitada a vontade de cada Estado. No Sul, defendo que haja um plebiscito separado. Certamente, os gaúchos serão contra o fim da venda de armas", diz.

"Gaúcho é assim mesmo, é diferente. Tudo que se construiu no Rio Grande foi a ferro e fogo." Ao falar da bancada gaúcha no Congresso, Mattos faz um paralelo com a histórica do povo do Sul. Começa por comentários sobre a luta dos índios contra os espanhóis, há 300 anos, e sai listando episódios em que os gaúchos enfrentaram o Uruguai, a Argentina, o Império, São Paulo, e assim vai. "Em 1835, brigamos contra o Império, foi a Revolução Farroupilha. Em 1860, fomos para a Guerra do Paraguai. Grande parte dos soldados era gaúcha. Em 1893, brigamos contra a Federação na Revolução Federalista. Em 1923, não tínhamos com quem brigar e brigamos contra nós mesmos. Nós somos assim. Vamos sempre para a briga."