Título: Lula reage, demite em estatais e manda PT mudar de estratégia
Autor: Vera Rosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/06/2005, Nacional, p. A4

Um dia depois de assistir calado às denúncias de que o PT pagava mesada a deputados em troca de apoio no Congresso, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva mudou a estratégia. Antes mesmo de abrir à noite o 4.º Fórum Global de Combate à Corrupção, onde disse que seu governo. se necessário, cortará "na própria carne", ele decidiu mostrar com todas as letras que não está refém do presidente do PTB, Roberto Jefferson (RJ) e cobrou do PT uma posição mais ofensiva em relação à crise política. Lula trocouDiante da má

, trocou toda a diretoria dos Correios e do Instituto de Resseguros do Brasil (IRB), dois focos de corrupção, e recuou da posição adotada na semana passada. Em menos de 48 horas, o governo - que lutava para enterrar a CPI pedida para investigar o propinoduto dos Correios - resolveu incentivar sua instalação.

Na noite de segunda-feira, Lula telefonou para o presidente do PT, José Genoino, que estava em São Paulo. Disse a ele que a nota divulgada pelo partido naquele dia, para rebater as acusações de Jefferson - segundo as quais o tesoureiro do PT, Delúbio Soares, pagava mesada de R$ 30 mil a parlamentares do PP e do PL -, tinha saído pior que a encomenda e era muito defensiva. O presidente ponderou a Genoino que o PT não podia parecer acuado e precisava reagir com mais veemência. Até porque, conforme acertado no gabinete de crise do Planalto, a ordem era insistir no sofisma de que as denúncias não eram contra o governo, e sim contra o PT.

ACERTO DE CONTAS

Foi depois desse telefonema que Lula e Genoino combinaram a nova estratégia. O presidente do PT deu entrevista ontem e, um pouco menos abatido, classificou as declarações de Jefferson de "infundadas, inverídicas e estapafúrdias". Afirmou, ainda, que o PT indicará os integrantes da CPI dos Correios. Além disso, o tesoureiro Delúbio - que estava proibido de falar - conversará hoje com os jornalistas, depois da reunião da Executiva do partido.

"Na semana passada, saímos daqui como aqueles que traíram a confiança do Lula e agora passamos a ser visionários", ironizou o deputado Ivan Valente (PT-SP). "Espero que o partido também desista do acerto de contas que ficou de fazer conosco." Traduzindo: não dar legenda para os "traidores" concorrerem à reeleição, em 2006.

A ordem no governo também é "liberar" os aliados para a criação da chamada CPI do Mensalão, que, na prática, pode não sair por falta de interesse dos parlamentares. "Acho que a bancada do PT deve pedir imediatamente a CPI para apurar as acusações de Roberto Jefferson", afirmou o deputado José Eduardo Martins Cardozo (PT-SP) . "Pela natureza dos fatos denunciados, uma investigação apenas na Corregedoria da Câmara é insuficiente, até porque só a CPI tem poderes de autoridade judicial para fazer uma apuração ampla e irrestrita."

A oposição, porém, aproveita a crise para jogar mais lenha na fogueira. Em discurso no plenário do Senado, o líder do PFL, José Agripino, disse ontem que o governo arruma artifícios para dizer que está apurando o que não está. "Vocês demitiram pessoas (nos Correios e no IRB) e colocaram todos na vala comum da corrupção. (...) Mas vossas excelências vão continuar em rota de colisão com a opinião pública", esbravejou Agripino, dirigindo-se ao líder do governo no Senado, Aloízio Mercadante (PT-SP), que antes defendera uma "investigação completa" de todas as acusações. "O governo não tem nada a temer", observou.

Depois das denúncias, os petistas também voltaram a cobrar de Lula a reforma ministerial que não houve. O presidente, porém, mostra dúvidas quanto às mudanças. "Tem de mexer nesse governo, dar uma sacudida", afirmou o deputado Devanir Ribeiro (PT-SP), amigo de Lula. "Não dá para ficar com Henrique Meirelles (presidente do Banco Central), que tem o procurador-geral da República, Cláudio Fontelles, pedindo investigação contra ele, nem com Romero Jucá (ministro da Previdência) sendo processado."