Título: Governo muda repasse para hospital
Autor: Lígia Formenti
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/06/2005, Vida&, p. A20

O Ministério da Saúde começa a testar nesta semana uma reforma no sistema de atendimento de hospitais com até 50 leitos, chamados de pequeno porte. A mudança tem como ponto de partida a forma de financiamento. Em vez do ressarcimento por cirurgias ou dias de internação, esses hospitais passarão a receber uma quantia fixa, calculada a partir da população atendida. A mudança estréia em 64 municípios do Ceará. Haverá fechamento de vagas e aumento nas verbas transferidas. "Vamos pagar mais, mas por um atendimento de melhor qualidade", justifica o secretário de Assistência à Saúde do ministério, Jorge Solla.

A mudança será feita por adesão de municípios e Estados. Além de o hospital ter no máximo 50 leitos, há outras condições: a cidade não pode ter mais de 30 mil habitantes e é preciso uma cobertura mínima do Programa de Saúde da Família. Esse perfil é preenchido por 1.292 hospitais, que atendem uma população de pouco mais de 12,1 milhões de habitantes.

Pela proposta do ministério, nesses locais o número de leitos seria reduzido de forma significativa: de 26,4 mil para 10,3 mil. "Atualmente, tais hospitais trabalham com número de leitos acima do considerado ideal. Além disso, a idéia é que eles se especializem em atendimentos simples. Nesses locais, seriam feitos, por exemplo, atendimento a crise de hipertensão, parto, complicações de diabete. Casos mais sérios têm de ser levados para lugares com melhor infra-estrutura", defende Solla.

Nessa forma de financiamento, haveria um aumento de recursos de R$ 71,1 milhões. Estados teriam de arcar com 50% desse acréscimo dos custos. O restante ficaria a cargo do governo federal. "Pode parecer um gasto a mais para secretarias estaduais, mas acreditamos que elas economizariam com a redução de atendimentos de média e alta complexidade."

INTERNAÇÃO DESNECESSÁRIA

Hospitais universitários já passaram por alteração semelhante. Hoje, em vez de receber ressarcimento por serviços prestados, recebem uma quantia mensal. O ministério pretende, dentro dos próximos meses, estabelecer também a mudança para hospitais de média e alta complexidade. A idéia é acabar, a médio prazo, com o sistema de ressarcimento por serviços prestados.

"Pagar hospitais por produção estimula a internação desnecessária ou por tempo maior do que o ideal", afirma Solla. Isso vale principalmente para hospitais de até 50 leitos. Para manter estrutura mínima, como lavanderia e cozinha, tais unidades têm um custo alto, comparando com o que recebem por internação. "Uma das formas de reduzir o prejuízo é internar de forma desnecessária. Ou adiar a alta", diz o secretário.

Levantamento feito pelo ministério mostra que 64% dos hospitais têm até 50 leitos. Muitos funcionam em sistema precário, com a presença de médicos restrita a alguns dias. O estudo detectou, por exemplo, que em 18% das unidades não havia clínicos gerais. O ministério atribui o número excessivo de pequenos hospitais a investimentos determinados por emendas parlamentares, "que raramente levam em consideração as necessidades de saúde de um local".

O consultor em Saúde Eugênio Villaça elogia a reforma proposta. "Quanto mais leitos existirem num hospital, maior será o número de internações", afirma. "Mas isso não significa melhoria nas condições de saúde. Essas internações acabam obedecendo apenas a uma lógica econômica, para sustentar os cofres dos hospitais", completa.