Título: Em SP, presidente se cala sobre acusações
Autor: Fausto Macedo
Fonte: O Estado de São Paulo, 07/06/2005, Nacional, p. A7

Durante cerimônia de lançamento do Viver em Comum-Unidade, programa da Caixa Econômica Federal para financiamento de máquinas de costura, o presidente Lula exaltou seu governo, afirmou que banco público "não tem que ter prejuízo, não tem que ser deficitário", lembrou da Singer que sua mãe usava, beijou e abraçou mulheres que o aplaudiram e lançou seu autógrafo em camisetas e cadernos, mas não fez referência às revelações do deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ). Quando criticou os juros altos, porém, falou dos "desonestos". "Vamos entender uma coisa", ele discursou no ginásio de esportes do Sesc-Interlagos, na periferia Sul de São Paulo, para uma platéia de costureiras e sem ministros. "Por que os juros no Brasil são tão altos? Meu caro Mentor (José Mentor, do PT, único deputado federal que prestigiou a festa), o juro no Brasil é alto porque normalmente as pessoas honestas pagam pelos desonestos."

Fez críticas a seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso, embora não tenha sido tão contundente como em outras ocasiões. "Este pequeno ato é uma demonstração de algumas coisas que já poderiam ter acontecido no Brasil há muito tempo, mas não aconteceu", enfatizou. "Por isso, a gente vai sempre trabalhando com muitos anos de atraso para fazer as coisas que, se tivessem sido feitas há 10 anos, certamente a situação de vocês (costureiras) seria infinitamente melhor."

Ao falar dos juros, ele insistiu em atacar os caloteiros. "Quando se vai calcular a taxa de juros coloca-se uma quantidade de pessoas que não vai pagar. Os bancos já dão de barato que um número de pessoas não vai pagar e aí os honestos que pagam têm que pagar os juros daqueles que vão dar o cano."

A festa para as costureiras - pelo menos 500 estavam lá -, deveria ter sido realizada no Instituto Rural Cardeal Rossi, no bairro de Campo Limpo, mas a segurança do presidente vetou o local, perto de uma favela. Para chegar ao Sesc, tiveram que viajar por mais de 2 horas de ônibus. "Toda vez que um governo tem dificuldade de fazer alguma coisa, na hora que ele pára para ouvir a sabedoria da consciência popular a tendência natural é ele acertar muito mais do que errar", disse Lula.

O bispo da Diocese de Campo Limpo, D. Emílio Pignoli, elogiou o projeto. "É um sonho que começa", declarou. Ao ser indagado sobre o lucro de 52% dos bancos nos primeiros meses do ano, enquanto cai a renda das famílias em um governo de esquerda, o bispo anotou. "Para mim é um mistério, depois da Santíssima Trindade é um mistério. Como é que não conseguem abrir mais perspectivas para o brasileiro? A máquina é muito complexa."

A costureira Solange Xavier dos Santos Silva subiu ao palanque com Lula para receber sua Singer, que lhe custou R$ 500 financiados a 2% ao mês. Desempregada há mais de 2 anos, ela ganha a vida dando aulas de alfabetização e de corte e costura na Associação Flor do Oriente em Itaquera. "Parece um sonho."