Título: Denúncias abalam mercados no País
Autor: Renée Pereira
Fonte: O Estado de São Paulo, 07/06/2005, Economia, p. B1

As denúncias do deputado Roberto Jefferson (PTB) contra o governo e o PT acertaram em cheio o mercado financeiro ontem. Com as incertezas em relação à postura do governo diante das acusações, que envolveram os nomes dos ministros José Dirceu (Casa Civil) e Antonio Palocci (Fazenda), os investidores optaram pela cautela e se desfizeram de vários papéis. O deputado, presidente do PTB, denunciou a existência de um esquema chamado "mensalão" - uma mesada de R$ 30 mil que seria distribuída a congressistas do PP e PL pelo tesoureiro do PT, Delúbio Soares, em troca de apoio.

Além disso, pela primeira vez, o ministro da Fazenda foi envolvido explicitamente nas denúncias. Segundo Jefferson, Palocci e Dirceu foram avisados do esquema de propinas e não fizeram nada. O que ajudou a azedar o humor do mercado.

O risco país, que revela a confiança dos estrangeiros no Brasil, avançou 15 pontos, para 431 pontos - alta de 3,61% em relação a sexta-feira. O índice refletiu o desempenho dos principais papéis brasileiros negociados no mercado internacional, que atuaram em terreno negativo durante todo o dia. O BR-40 caiu 0,67%, para 118,30% do valor de face, e o C-Bond recuou 0,12%, para 102%.

A Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) também não resistiu à turbulência política e despencou 3,07%. O dólar subiu 0,95% e fechou cotado em R$ 2,450. Da mesma forma, os juros futuros também foram pressionados e terminaram o dia em alta. Os contratos de janeiro de 2006, por exemplo, avançaram de 19,41% para 19,51%.

Segundo analistas, até a semana passada o mercado vinha assimilando razoavelmente bem o caso dos Correios. A preocupação maior do governo era colher assinaturas contra a CPI e tentar montar estratégias para investigar o assunto por meio da Polícia Federal.

Mas, além de ampliar a gravidade da crise, as novas denúncias chegam no momento em que o governo tem pouca coisa para mostrar e está na defensiva por causa da desaceleração da economia, avalia o economista Marcelo Allain, professor do MBA da Fipe/USP. "Com o Produto Interno Bruto (PIB) abaixo das expectativas no primeiro trimestre, consumo e investimentos em queda, juros elevados e pobreza aumentando, há muito que explicar para a população", argumenta ele. "Isso tudo afeta a percepção do investidor até o fim do ano."

O comportamento do mercado financeiro ontem poderia ter sido ainda mais negativo não fosse a calmaria no mercado internacional, com as bolsas americanas fechando em alta, afirma o estrategista do BankBoston, Odair Abate. Segundo ele, o humor do mercado nos próximos dias depende da postura do governo em relação às denúncias e de fatos novos, a favor ou contra.

O problema é que daqui para frente - a pouco mais de um ano das eleições presidenciais - muitas situações semelhantes podem ocorrer e sacudir o mercado, diz ele. "Apesar disso, acredito que pouca coisa estrutural vai acontecer na economia do País."

Essa opinião é compartilhada pelo economista da Gap Asset Management Alexandre Maia, que não acredita em mudanças na política econômica do País. Segundo ele, o que existe hoje é uma piora transitória no preço dos ativos. "Diante da incerteza, o investidor tem medo do que vai acontecer e prefere ficar fora do jogo." No exterior, apesar de o cenário favorável aos emergentes, a crise deve merecer acompanhamento.