Título: 'Houve apuração e ninguém ficou prevaricando', diz Dirceu
Autor: Jair Rattner
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/06/2005, Nacional, p. A12

O ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, disse ontem em conferência em Lisboa, no Instituto de Estudos Estratégicos Internacionais de Portugal, que não se pode misturar casos isolados de corrupção nos Correios ou no Instituto de Resseguros do Brasil (IRB) com o presidente ou o governo. "O governo tem investigado, tem punido e tem demitido", disse. Sobre o "mensalão", afirmou que "a denúncia foi apurada e ninguém ficou prevaricando". Salientou que "houve uma investigação da Corregedoria da Câmara que é dirigida por um partido da oposição e pelo Ministério Público".

Na conferência, em que estavam cerca de 30 intelectuais, políticos, especialistas em política internacional e jornalistas portugueses, Dirceu disse que "há problemas que precisam ser investigados, mas esses não podem ser transformados em responsabilidade do presidente, do PT, do governo ou em crise política institucional". Ele vê aí "razões de política eleitoral, ligadas a antecipação da agenda das eleições de 2006".

Para o ministro, a oposição procura desde o início do governo antecipar a disputa eleitoral. "Primeiro, disseram que devia estabilizar o País, depois, que a agenda social era muito grande, em seguida, que o ajuste era muito duro. Diziam que o País não cresceria, e cresceu, que não iam ser criados empregos, e foram. Depois voltou o debate para ética, acusando o governo de ser complacente, conivente ou participar de eventos de corrupção que há realmente na administração pública."

Dirceu afirmou que o País se encontra em instabilidade política e impasse porque o governo perdeu a maioria na Câmara. "Por erros do meu partido, o PT perdeu a presidência da Câmara e não conseguiu equacionar bem a aliança com o PMDB que é o primeiro partido do Senado e o segundo na Câmara." O ministro admite que o momento seja grave, "porque envolve instituições importantes como Correios e IRB, embora sejam de terceiro escalão, e um presidente de partido, um deputado que apoiava o governo e supostamente outras autoridades que apoiavam o governo".

BARRAMENTO

Dirceu atribuiu a crise à necessidade que o PT teve de fazer alianças para obter maioria no Congresso. Disse que numa aliança de centro-esquerda, o partido só atingiria entre 20% e 30% da Câmara e do Senado. "Nós estamos pagando agora, com essa crise política, o preço de formar maioria de 50% mais 1 no parlamento." Ele considera que essa situação será resolvida com uma reforma política, que incluiria a fidelidade partidária, financiamento público das campanhas políticas e a cláusula de barramento, em que nenhum partido poderia eleger deputados se não tivesse porcentagem mínima de apoio dos eleitores.

Como exemplo, Dirceu citou a Alemanha, onde são necessários ao menos 5% dos votos. Essa reforma, em sua opinião, resolveria o problema enfrentado hoje para tomar decisões no Legislativo, em que a Câmara conta com 14 partidos e nenhum tem mais de 12% dos deputados.

A respeito das metas propostas pelo governo, o ministro afirmou que houve excesso de prioridade. "Tenho dito ao presidente que talvez tenhamos sido muito ingênuos na nossa boa-fé socialista ao propor a reforma agrária, agricultura familiar, tecnologia, saúde, educação, política industrial, política da América do Sul, consolidação do Mercosul. É um programa muito ambicioso e muito vasto." Mas reafirmou que o governo tem dado cabo da tarefa.

Explicando sua atuação no governo, afirmou que procura fazer mediação entre a política de desenvolvimento e a econômica. Disse que tem papel pedagógico, de disputa política se necessário, falando com o partido, a bancada, procurando costurar acordos. Deu exemplo: "A autoridade monetária, se deixarem, teria um superávit de 7% e uma taxa de juros de 20%."