Título: Para tentar uma vaga na ONU, Brasil abre mão de direito a veto
Autor: Carlos Marchi
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/06/2005, Nacional, p. A14

Brasil, Alemanha, Índia e Japão distribuíram ontem, em Nova York, uma emenda ao projeto de reforma da Organização das Nações Unidas (ONU), na qual abrem mão do direito de veto durante pelo menos 15 anos se ganharem assentos permanentes no Conselho de Segurança da instituição. Na última semana, China e Rússia deram sinais de que não apoiarão as indicações dos quatro países, que que formam o chamado G-4, a assentos permanentes no Conselho de Segurança. O projeto de resolução adotado pela Assembléia Geral da ONU no dia 16 de maio prevê a ampliação do Conselho de Segurança para 25 membros. Pela emenda distribuída ontem, a nova versão do Conselho daria assentos permanentes para os países do G-4 e mais dois países africanos a serem escolhidos, além de criar quatro novos postos rotativos. Atualmente o Conselho de Segurança tem 15 membros, sendo 5 permanentes (EUA, Rússia, Inglaterra, França e China), com direito a veto, e 10 rotativos.

A emenda do G-4 abre mão do direito de veto por um prazo determinado, mas assegura que, uma vez vencido o prazo de 15 anos, será feita uma nova revisão do quadro de membros do Conselho e examinada com destaque a concessão do direito de veto aos quatro. Estabelece também que "os novos membros permanentes deverão ter as mesmas responsabilidades e obrigações dos atuais membros permanentes".

PERIGO

No início do mês o embaixador chinês na ONU, Wang Guangya, classificou de "muito perigoso" o projeto de resolução sobre a ampliação do Conselho de Segurança apresentado em maio pelo G-4. Na ocasião, o embaixador adiantou que a China usará o seu poder de veto para barrar a iniciativa, se ela for aprovada por dois terços dos 191 países membros que integram a Assembléia Geral.

O principal incômodo da China não tinha a ver com o Brasil e era motivado por sua secular rivalidade com o Japão, que ocupou a Mandchúria antes e durante a 2.ª Guerra. Mas, dois dias depois, a China voltou a fustigar o Brasil, e novamente por razões indiretas: colocou-se contra a prorrogação da missão de paz no Haiti, que é comandada pelo Brasil. Desta vez, a razão é a longa amizade entre o Haiti e Taiwan e a programação de visita do presidente haitiano à ilha que a China sonha anexar a seu território.

O governo brasileiro pagou um alto preço para ter o apoio da China. Primeiro, defendeu seu ingresso na Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), juntamente com Índia e África do Sul. Em maio de 2004, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi a Pequim e recebeu apoio para o ingresso do Brasil no Conselho de Segurança. Como contrapartida, o Brasil reconheceu, com uma criticada elasticidade de conceitos, que a China tem uma economia de mercado.

O mais grave é que no dia seguinte a Rússia criticou a linha do projeto do G-4, afirmando que a reforma do Conselho de Segurança deveria privilegiar um modelo compacto para agregar eficiência. Mesmo sem indicar formalmente uma posição, a declaração foi tomada pelos especialistas como uma postura contra o projeto do G-4.