Título: Villepin x Sarkozy: primeiro round termina em empate
Autor: Reali Júnior
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/06/2005, internacional, p. A18

O Parlamento da França deu ontem um voto de confiança ao novo governo francês, liderado conjuntamente pelo primeiro-ministro Dominique de Villepin e o ministro do Interior, Nicolas Sarkozy. Confirmando o que a mídia local classifica de "governo de duas cabeças", Villepin apresentou o programa de governo à Assembléia Nacional e Sarkozy, ao Senado. Em seu pronunciamento, Villepin e Sarkozy disseram que a luta contra o desemprego, que atinge mais de 10% da força de trabalho do país, é prioridade absoluta. O primeiro-ministro destacou que a idéia básica é "combater esse flagelo" governando por decreto, com autorização legislativa. Ele prometeu resultados já nos primeiros cem dias de administração.

Mas há algo que pode atrapalhar a ambiciosa meta. Os dois homens fortes, nomeados para governar a França pelo presidente Jacques Chirac, não escondem que têm sérias divergências. Eles não se entendem principalmente nas políticas de segurança interna e imigração, embora integrem o mesmo partido conservador. Nem mesmo durante os governos da "coabitação francesa" (um presidente de esquerda e um primeiro-ministro de direita, ou vice-versa) constatou-se um desentendimento tão claro.

Recentemente, Sarkozy manifestou seu "pouco respeito" por políticos que jamais disputaram um mandato pelo voto popular. Ele aludia claramente a Villepin, que nunca disputou uma eleição.

O fato de um apresentar os planos de ação na Assembléia Nacional e o outro no Senado constitui, segundo analistas de política, o início de uma "guerra fria" de bastidores, cujo desfecho ninguém se atreve a prever. Por enquanto, ambos têm procurado aparentar união e tentado reduzir a importância de seus desacordos.

O governo começa a agir com a decisão de Sarkozy de promover um acerto de contas pessoal. Afastou policiais suspeitos de terem estimulado com comentários desairosos os boatos sobre a crise conjugal que ele admite estar atravessando. Sarkozy demitiu o diretor de comunicações da polícia convencido de que esse policial, há 12 anos no cargo, é responsável pelo vazamento para a imprensa das versões sobre seus problemas amorosos.

Já se anuncia que outras cabeças vão rolar, até mesmo nos serviços secretos franceses e na direção do serviço de segurança interna, a DST. Esse organismo é dirigido por Pierre de Bousquet de Florian, homem de confiança de Villepin e Chirac.

Desde que aceitou voltar ao Ministério do Interior, Sarkozy tem dito a amigos que, controlando os serviços especiais da policia francesa, poderá melhor se proteger de ataques pessoais. E, dessa forma, preservar sua candidatura presidencial até 2007. Sarkozy suspeita de que tenha partido da DST uma lista de corruptos enviada à Justiça. Nela, ele aparece como um dos titulares de contas bancárias secretas em bancos de Luxemburgo, conhecidas como Clearstream.

Na época, a DST estava sob o comando de Villepin, então ministro do Interior. Hoje, Sarkozy vai participar de um seminário sobre outro tema polêmico: a política de imigração. Seu pronunciamento poderá dar mais uma medida das divergências com Villepin. Ao contrário do primeiro-ministro, ele é favorável a um rígido controle dos imigrantes e um forte patrulhamento das fronteiras.