Título: Cientista receita clonagem ao Brasil
Autor: Cristina Amorim
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/06/2005, Vida&, p. A22

O cientista sul-coreano Woo-Suk Hwang, que ganhou notoriedade mundial no mês passado ao demonstrar avanço na clonagem terapêutica, disse ontem em Curitiba que o Brasil precisa rever a proibição da técnica. Políticos brasileiros também acreditam haver espaço para a inclusão da clonagem terapêutica na Lei de Biossegurança em vigor. Hwang afirmou que escolheu o Brasil como o primeiro país a visitar após a publicação do seu artigo na prestigiosa revista Science (no qual mostra como obteve 11 linhagens de células-tronco a partir de embriões clonados de pacientes) para estimular o debate e o avanço local da legislação. Aprovada em março no País, a Lei da Biossegurança proíbe as duas formas de clonagem: a terapêutica, que prevê a formação de embriões apenas para a obtenção de células-tronco, e a reprodutiva, com o intuito de criar uma pessoa. Para Hwang, a sociedade científica brasileira deve continuar a debater a questão com os legisladores.

"Sei que há pesquisadores muito competentes que trabalham com células-tronco no Brasil e que uma lei aprovada há pouco tempo permite o trabalho com embriões congelados. Mas os dois tipos de células-tronco embrionárias, essa e a obtida de embriões clonados, são potencialmente importantes (para a medicina). Espero que o governo apóie os dois tipos no futuro", afirmou.

A Lei de Bioética e Biossegurança da Coréia do Sul, que permite a prática, só entrou em vigor em 1º de janeiro, não antes de um debate que tomou quatro anos. Hwang lembrou que apenas sua equipe tem, por ora, autorização para desenvolver a técnica no país. "Cada nação tem sua própria cultura e diferentes pontos de vista social, político e religioso. No entanto, acho que o governo brasileiro também chegará a uma conclusão favorável (sobre a clonagem terapêutica) no futuro." Além da Coréia, apenas a Grã-Bretanha permite a prática atualmente.

"Nossa experiência mostra um caminho para o Brasil e outros países que desejam desenvolver a biotecnologia, especialmente tendo em vista a cura para doenças hoje intratáveis. Eu quero - e eu espero - que haja alguma colaboração entre Brasil e Coréia não apenas no campo da pesquisa com células-tronco, mas também no campo da clonagem terapêutica."

Para o senador Osmar Dias (PDT-PR), a Lei da Biossegurança deve ser revista dentro de no mínimo cinco anos, para que a clonagem terapêutica seja incluída no texto. "À medida que as pesquisas avancem, será necessário repensar a proibição", disse. Dias, que participou de uma mesa-redonda sobre a lei brasileira no 17º Congresso Brasileiro de Genética Clínica, foi o relator do projeto da lei na Comissão de Educação e Ciência do Senado e incluiu a prática - subtraída posteriormente pelo senador Ney Suassuna (PMDB-PB), quem assinou o texto final antes de ele voltar para a Câmara, onde foi aprovado.

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Hwang ficou só um dia no Brasil para explicar detalhes da técnica no congresso, que acaba hoje, a uma platéia predominantemente jovem. Sorridente, foi tratado como celebridade, com direito a fotos e abraços. Ao receber uma camisa da seleção brasileira de futebol da organização do evento, levantou-se e a beijou, arrancando aplausos.

No entanto, o sorriso sumiu quando questionado sobre a possibilidade de clones humanos surgirem em decorrência do avanço da ciência. Com a mesma intensidade que defende a clonagem terapêutica, Hwang combate a versão reprodutiva. Em Curitiba, repetiu que clonar pessoas é "antiético, pouco seguro e biologicamente impossível" - pelo menos com o conhecimento atual. "A clonagem reprodutiva deve ser banida em todo o mundo."

O sul-coreano admite que a técnica precisa ser aprimorada. Ainda que seja a primeira vez que se obtém células-tronco a partir de um embrião clonado, ainda há diversos problemas a serem resolvidos antes do uso clínico da clonagem terapêutica. "Ainda são necessários mais alguns anos para que a pesquisa vire tratamento."