Título: Poucas, mas boas
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/06/2005, Notas & informações, p. A3

São ainda muito poucas as indústrias brasileiras que adotam iniciativas de inovação e de diferenciação de seus produtos, mas elas detêm uma fatia expressiva da produção industrial e pagam salários mais altos. Embora em pequena quantidade, essas indústrias mostram que a concorrência, interna e externa, forjou um novo empresariado, preocupado em competir até nos mercados dos produtos de alta tecnologia. E são elas que apontam para as demais o caminho que pode conduzir ao crescimento mais rápido.

O Ipea acaba de concluir o maior estudo já realizado sobre o nível tecnológico da indústria, no qual constatou que apenas 1,7% das empresas inova e diferencia seus produtos. É uma fatia ínfima do universo de 72 mil indústrias com mais de 10 pessoas ocupadas. Mas essa fatia é responsável por 26% do faturamento da indústria e emprega 13% da mão-deobra ocupada pelo setor. Essas empresas formam a mais dinâmica das três categorias em que o estudo dividiu as indústrias. São elas que conseguem produzir bens de maior valor agregado, que chegam a alcançar preço 30% superior ao das que não investem em modernização e em diferenciação. A segunda categoria é a das empresas especializadas em produtos padronizados, que focam sua atuação na redução de custos, em vez da criação de valor. Das empresas pesquisadas, 21% estão nessa faixa, mas respondem por 62,6% do faturamento total. Já as demais indústrias, que não inovam nem diferenciam produtos, compõem a maior fatia, 77% do total, mas sua participação no faturamento total é de apenas 11,5%. Entre as inovadoras estão setores como eletrônico, mecânico, e químico; a segunda categoria inclui setores como agroindústria, madeiras e móveis e metalurgia. As indústrias que investem na modernização de produtos e atualização tecnológica são também as que têm mais chances de conquistar mercados externos. Diferença notável entre essas indústrias e as demais ocorre também com relação à mão-de-obra. As empresas inovadoras pagam salários mais altos (em média de R$ 1.254,64 em 2000, ano em que se baseou a pesquisa, contra R$ 749,02 nas indústrias especializadas em produtos padronizados e R$ 431,14 nas demais), empregam pessoal com maior escolaridade (9,1 anos de estudo, contra 7,6 anos na segunda e 6,9 anos na terceira) e oferecem maior estabilidade no emprego (seu pessoal permanece no emprego, em média, 54,1 meses, contra 43,9 meses nas indústrias da segunda categoria e 35,4 nas demais).

Se do conjunto das empresas inovadoras forem destacadas aquelas que investem no exterior, a diferença com relação às demais é ainda maior no que se refere à remuneração: elas pagam salários mensais médios de R$ 1.318,40, contra R$ 505,60 pagos pelas demais. É claro que o resultado dessa combinação (salários mais altos, empregos mais estáveis e maior escolaridade) é produto de melhor qualidade, produtividade mais alta e lucratividade maior. Quanto mais preparado e treinado o trabalhador e mais atualizadas as técnicas de produção, mais valor se agrega ao produto.

Um dado curioso da pesquisa é o que se refere aos investimentos das empresas brasileiras e estrangeiras em inovação: as nacionais investem mais (R$ 2 bilhões, contra R$ 1,7 bilhão). Mas a diferença é explicável pelo fato de as empresas estrangeiras investirem mais em suas sedes do que em suas subsidiárias.

A concentração da indústria no Sudeste do País era um fenômeno conhecido, mas o estudo do Ipea apresenta números que impressionam. Nessa região estão 79% das indústrias, que empregam 53% da mão-deobra total do setor. Outro número impressionante: 250 municípios (menos de 5% do total) respondem por 70% da renda auferida pelos empregados na indústria.

Somente pelo fato de apresentar um retrato abrangente e bastante nítido do interesse da indústria brasileira em desenvolver produtos e adotar tecnologias e processos mais modernos, o estudo já se justificaria. Sua importância pode ser ainda maior, pois, se bem utilizado pelo governo, pode auxiliá-lo na tarefa de definir e colocar em prática políticas destinadas a elevar o padrão da indústria.