Título: Presidente se irrita com críticas de Dirceu a Palocci
Autor: Beatriz Abreu, Colaborou: Christiane Samarco
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/06/2005, Nacional, p. A8

O presidente Lula não gostou das críticas que o ministro José Dirceu fez à política econômica quando estava em Lisboa, na quarta-feira. Interlocutores do presidente disseram ao Estado que Lula estranhou o fato de Dirceu ter retomado o ataque às altas taxas de juros e ao superávit primário justamente no momento da mais grave crise política do governo, motivada pelas declarações do deputado Roberto Jefferson. Dirceu voltou ontem da viagem de quatro dias a Madri e Lisboa, onde manteve encontros com governos dos dois países, empresários e líderes sindicais. Ao falar sobre "O Momento Atual do Brasil", durante almoço no Instituto de Estudos Estratégicos Internacionais de Lisboa, Dirceu afirmou que a base social do PT está tensa. "Se deixarem, (integrantes da equipe econômica) fazem o superávit primário de 7%, juros de 20%. Isso é uma disputa política. Não falar isso é faltar com a verdade para a sociedade", afirmou.

As declarações de Dirceu, fora do País, deixaram Lula contrariado. Ainda ontem, em conversas reservadas, o ministro mostrou aborrecimento, mas não com o que falou. Ele acha que o PT reagiu muito mal à crise e adotou atitude defensiva. Acredita, porém, que tem um trabalho "pedagógico" a ser feito dentro do governo e não pode abrir mão de expressar suas opiniões. Seu argumento é que não deseja duelo com o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, mas, sim, uma política de desenvolvimento mais ativa. Para tanto, defende correções na economia.

No Palácio do Planalto e nas fileiras do PT, há os que fazem uma leitura mais pragmática: descontente no governo, o ministro tentaria uma aproximação maior com o partido que presidiu durante 8 anos, de 1995 a 2002. Fiador das alianças eleitorais com legendas de centro e de direita, Dirceu comprou muita briga no PT para abrir espaço àqueles que hoje ministros como Olívio Dutra, de Cidades, chamam de "más companhias". Em tom de justificativa, o chefe da Casa Civil disse, em Lisboa, que o governo está pagando agora o preço de ter sido obrigado a compor para ter maioria no Congresso.

Com a crise instalada pelas denúncias de Jefferson, o bombardeio à coalizão governista por parte dos petistas voltou à cena. Na esteira, os ataques à política econômica também ganharam destaque.

"Eu sugiro pequenas correções e ajustes na política econômica há um ano e meio. Mas que fique bem claro: isso não é de hoje", ressalvou o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP). "Acho que há espaço para uma inflexão porque a inflação está cedendo. Sempre sugeri uma meta de inflação mais realista, mas acho que o ministro Palocci está fazendo um grande trabalho e tem todo o meu apoio."

O deputado Ivan Valente (PT-SP) afirmou que todos no PT querem mudança na política econômica, mas nem todos têm coragem de expressar essas idéias. "Até o ministro Dirceu tem dito o que nós falamos", observou Valente, que integra a ala radical, durante reunião de ontem da bancada do partido.