Título: Governo inicia racionamento de gás
Autor: Nicola Pamplona e Kelly Lima
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/06/2005, Economia, p. B1

O governo iniciou ontem um programa de racionamento de gás para evitar o desabastecimento do mercado nacional, causado pela crise boliviana. Usinas térmicas e refinarias da Petrobrás já tiveram o fornecimento reduzido. Segundo o diretor da Área Internacional da estatal, Nestor Cerveró, as importações de gás boliviano podem começar a cair nos próximos cinco ou seis dias, caso as instalações petrolíferas locais continuem ocupadas por manifestantes.

De acordo com nota divulgada pela Petrobrás, o racionamento será focado em segmentos que podem usar combustíveis alternativos. A empresa garantiu que o mercado residencial não será afetado. O plano não afeta também os consumidores de gás de botijão (GLP), derivado do petróleo diferente do gás natural.

Há dúvidas sobre o que fazer com o gás natural veicular (GNV), segmento que mais cresce no Brasil. Segundo um participante da reunião, o caso é complicado, pois seria necessário cortar todo o fornecimento nacional de GNV. O governo criou um grupo de trabalho com as distribuidoras e produtores de gás para avaliar essa e outras questões do mercado de gás.

O governo passou as últimas semanas minimizando o impacto da crise boliviana sobre o mercado brasileiro e a demora em agir foi bastante criticada ontem. "Essa é uma crise anunciada. Falamos disso no ano passado e fomos tachados de mensageiros do apocalipse", afirmou o secretário de Energia, Indústria Naval e Petróleo do Estado do Rio, Wagner Victer.

O Brasil importa da Bolívia 24 milhões dos 39 milhões de metros cúbicos (m3) que consome diariamente (excluindo o volume usado pelas refinarias). O produto é destinado aos mercados automotivo, residencial, comercial e industrial, que deve ser privilegiado em caso de falta de gás. O cenário utilizado nas negociações de ontem prevê uma redução de até 50% das importações em um prazo de 10 dias.

"O erro foi o Brasil depender tanto do gás boliviano", avaliou o diretor de Exploração e Produção da Petrobrás, Guilherme Estrella, ao comentar as declarações de Victer. Ele disse que o gás é um insumo muito importante para que o País esteja tão dependente de importações.

"A situação é crítica, nós bem sabemos, mas estamos tomando medidas", disse a secretária de Petróleo e Gás do Ministério de Minas e Energia, Maria das Graças Forster. Outra vertente do plano prevê o aumento da produção interna do combustível para evitar cortes drásticos no fornecimento.

A entrada em operação das plataformas P-43 e P-48, na Bacia de Campos (RJ), vai acrescentar mais 2 milhões de m3 de gás à produção. Na mesma bacia, segundo técnicos da estatal, existe a possibilidade de aproveitar mais 1 milhão dos 7 milhões de m3 que são queimados diariamente nas plataformas. Esses 3 milhões de m3 serão enviados a São Paulo, Estado que mais sofrerá com o racionamento, já que 75% do gás que consome vem da Bolívia.

Esta semana, opositores do governo da Bolívia invadiram instalações de transporte e armazenagem de combustíveis líquidos no País. Como o gás local é retirado com um tipo de óleo chamado condensado, as empresas terão de reduzir a produção de gás por falta de espaço para armazenar a parte líquida. A espanhola Repsol, maior produtora local, já reduziu a produção diária em 3,5 mil barris de óleo.