Título: Com ressalvas, TCU aprova contas da União
Autor: Sérgio Gobetti
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/06/2005, Nacional, p. A15

Em uma sessão repleta de críticas à política fiscal do governo Luiz Inácio Lula da Silva, o Tribunal de Contas da União (TCU) aprovou ontem as contas da administração federal de 2004, mas com 30 ressalvas - como a constatação de que a União não investiu o mínimo de recursos determinado pela Constituição na erradicação do analfabetismo e no ensino fundamental. Dos 118 programas governamentais avaliados pelos técnicos do TCU, 53% foram classificados como insatisfatórios, por não terem alcançado 60% das metas físicas estipuladas na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).

O baixo desempenho da ação governamental foi detectado até mesmo entre os programas considerados prioritários pelo próprio governo Lula, como o de Saneamento Ambiental Urbano (30% de execução física) e o da Manutenção da Malha Rodoviária Federal (33%). Entre as 43 prioridades identificadas, 58% receberam nota insatisfatória.

O relatório completo com a avaliação das contas de 2004, de autoria do ministro Benjamin Zymler, também aponta o aumento da carga tributária brasileira, de 34,69% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2003 para 35,74% do PIB no ano passado. O cálculo foi feito pelos técnicos do tribunal com base nos dados oficiais para a arrecadação da União e dos Estados e em estimativas próprias para a arrecadação dos municípios.

Na esfera federal, a receita líquida de tributos (descontadas as transferências para governos estaduais e prefeituras) cresceu R$ 37,8 bilhões no ano passado (17,6%), enquanto a despesa aumentou R$ 30,3 bilhões (13,5%) - ambas acima da inflação.

De acordo com o relatório, esses patamares "elevados" de tributação e gasto "atestam o descumprimento do compromisso assumido" na Lei de Diretrizes Orçamentárias de reduzir as despesas e manter estável a receita fiscal da União como proporção do PIB.

A política de geração de "superávits primários" (economia para pagamento de juros), em detrimento dos investimentos em infra-estrutura e na área social, também mereceu severas críticas de vários ministros do Tribunal de Contas da União durante a apresentação do voto de cada um.

"A minha convicção é de que o governo deveria repensar o modelo de gerenciamento fiscal e monetário em voga", afirmou o presidente do tribunal, Valmir Campelo.

Segundo o levantamento feito por Zymler, o governo mantinha parado no caixa, no final do ano passado, R$ 3,4 bilhões dos recursos recolhidos para o Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust) e R$ 9,75 bilhões da receita da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide).

Esse dinheiro, que deveria ter sido aplicado para financiar diversos investimentos nas áreas de comunicações, transportes e meio ambiente, está ajudando o governo a contabilizar um superávit maior.

DESORGANIZAÇÃO

O capítulo especial dedicado à radiografia dos investimentos em infra-estrutura é um testemunho da crise gerencial e desorganização dos órgãos de planejamento e fiscalização.

O relator constata que "o governo federal não dispõe de informações consolidadas" sobre os investimentos e que as agências reguladoras enfrentam sérios problemas estruturais. "A despeito da relevância do tema 'investimentos em infra-estrutura' na atual conjuntura, a inércia em termos de apuração das informações é considerável", diz o relatório.

O Ministério dos Transportes, por exemplo, enfrentou enormes dificuldades para levantar as informações requeridas pelo TCU, e os dados que apresentou sobre os investimentos públicos em rodovias representam, em determinados anos, apenas 10% do valor fornecido pelo Ministério do Planejamento.

A diretoria da Agência Nacional de Transportes Aquáticos (Antaq) declarou ao tribunal não possuir informação sobre os investimentos privados no setor entre 1999 e 2004.