Título: Diferenças entre meninos e meninas, em exame escolar
Autor: Renata Cafardo
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/05/2005, Vida, p. A12

Eles são melhores em matemática, por exemplo. Elas, em leitura. As conclusões são de estudo internacional

Meninos de quase todos os países analisados pelo Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa) se saem melhor em matemática que as meninas. Entre as 41 nações que participaram do exame em 2003, apenas na Islândia elas tiveram melhor desempenho. No Brasil, que amargou o pior resultado na disciplina, as meninas fizeram 348 pontos e os meninos, 365, numa escala que pode passar de 660. Em leitura, que não era o foco principal, mas também foi avaliada, a situação é inversa: em todos os países as meninas estão à frente. O relatório completo da avaliação, feita a cada três anos pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômicos (OCDE), foi divulgado na semana passada na capital. Pela primeira vez, ele foi publicado em português, pela Editora Moderna. O Pisa 2003 avaliou 250 mil jovens de 15 anos e deu ênfase à matemática; o próximo será em 2006 e focado em ciências. "As garotas constantemente mostram muito menos interesse em matemática, acreditam menos nelas mesmas para as tarefas e apresentam maiores taxas de desamparo e stress durante as aulas", disse ao Estado o diretor do programa Pisa, o alemão Andreas Schleicher.

De uma maneira geral, os meninos fizeram 11 pontos a mais que as meninas nas provas de matemática em todos os países. Entre eles, 16,9% estão nos níveis 5 e 6 de proficiência, os dois mais altos. Elas somam 12,4% nesses níveis.

Brincadeiras e afazeres de meninos e meninas na infância podem contribuir para essas diferenças. "No Brasil, longe das grandes cidades, as meninas ainda assumem tarefas domésticas, cuidam dos irmãos. Os meninos saem mais de casa, jogam futebol e têm uma relação maior com espaço e forma", diz a consultora para o Pisa na área de matemática do Instituto Nacional de Pesquisas e Estudos Educacionais do Ministério da Educação (Inep/MEC), Maria Teresa Soares.

O exame de matemática do Pisa é dividido em quatro áreas. A que é chamada de espaço e forma - com questões de geometria, raciocínio espacial e modelos bi e tridimensionais - registra as maiores diferenças a favor dos meninos. A área em que as meninas se saem melhor é a denominada quantidade, em que estão mais presentes informações da vida cotidiana, como problemas sobre taxa de câmbio e preços. Segundo Schleicher, o Pisa constatou que elas conseguem melhor resultado em soluções de problemas que não estão ligados diretamente com a disciplina de matemática. "Parece que é o contexto da matemática na escola que impõe barreiras para as meninas se saírem bem", completa. Para ele, as escolas precisam desenvolver o interesse e a confiança das meninas na disciplina.

DIFERENÇAS CEREBRAIS

Fora o contexto cultural e social, há diferenças no mecanismo de dominância cerebral de homens e mulheres. O predomínio do hemisfério esquerdo do cérebro - ligado à lógica, aos códigos - é maior no sexo masculino. Esse predomínio também existe no sexo feminino, mas é menor, com significativa influência também do hemisfério direito, o da intuição. "Meninos têm mais noções espaciais, enquanto na área da linguagem elas levam vantagem", diz o professor de neuropediatria da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Luiz Celso Vilanova. "Isso facilita, mas não quer dizer que não há mulheres que se dêem bem em matemática ou homens, em linguagem."

O Pisa 2003 mostrou que, em média, os meninos fizeram 34 pontos a menos que as meninas na área de leitura. No Brasil, eles somaram 384 pontos e elas, 419. "Eu gosto mesmo é de português, história e geografia. E todas as minhas amigas também", diz Tainara Paulon Protásio, de 15 anos. "Na socialização do menino, ele é canalizado para a individualização, baseada no afastamento. As meninas, para o apego e a verbalização, por isso há facilidade em comunicação", diz a professora do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília (UnB), Maria Helena Fávero, que estuda educação e gênero. "Melhores práticas educativas das famílias podem mudar essas situação."

No começo do ano, o reitor da Universidade Harvard, Lawrence H. Summers, causou polêmica ao dizer que diferenças inatas entre os gêneros explicavam o menor número de mulheres cientistas bem sucedidas. Ele teve de pedir desculpas em público, depois de protestos de feministas e cientistas em todo o mundo. No Pisa, o desempenho de meninos e meninas na área de ciências oscila conforme o país, mas há predominância masculina entre as maiores pontuações. No Brasil, os resultados de ambos os sexos são os mesmos. Nos Estados Unidos, país de Summers, a diferença também não foi considerada estatisticamente significativa, segundo o relatório Pisa.