Título: Guerra política atrasa MP do Bem
Autor: Lu Aiko Otta
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/06/2005, Economia, p. B1

O Planalto apostará em medidas econômicas para tentar reverter, esta semana, o clima negativo provocado pelas denúncias de corrupção na base aliada. Mas, para isso, precisará superar suas próprias divergências internas sobre como conduzir a economia diante da crise. Na semana passada, ficou mais uma vez evidente a divisão entre o que prega o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, e a ala política do Planalto. Palocci quer fortalecer as bases da política econômica. Na ala política, liderada pelo ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, cresce a insatisfação com o aperto nos gastos e o baixo crescimento.

As apostas para animar a economia real estão na chamada "MP do Bem", a ser anunciada na quarta-feira. Ela deveria ter sido divulgada na quinta-feira passada. No entanto, a área política decidiu transformar a MP, inicialmente pensada para estimular o investimento em exportação, em um anúncio de impacto da chamada "agenda positiva". A área econômica resistiu a alguns dos acréscimos propostos e, dessa forma, a "MP do Bem" transformou-se no palco da batalha interna do governo.

A ala política do governo é favorável à inclusão de um dispositivo que permitiria deduzir do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) os gastos com empregados domésticos com carteira assinada. Além de agradar à classe média, tiraria da informalidade uma boa parcela dos 6 milhões de empregados domésticos do País e elevaria a arrecadação do INSS.

Palocci é contra e vetou a proposta numa reunião na noite de quarta-feira. No entanto, na sexta-feira a proposta continuava viva no Palácio do Planalto, assim como outros pedidos de isenções tributárias para os mais variados setores. De Londres, onde estava na sexta-feira, Palocci avisou que a "MP do Bem" custará R$ 1,5 bilhão em renúncias fiscais. Com isso, fixou um limite para as "bondades", o que significa que, se prevalecer sua opinião, nem todas as propostas serão atendidas. Mesmo se ficar no que havia sido pensado inicialmente, a "MP do Bem" será bem recebida.

Com alguma sorte, o Comitê de Política Monetária (Copom) deixará de elevar as taxas de juros em sua reunião desta quarta-feira - não por causa das cobranças do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ou das críticas da turma do fogo amigo, mas porque a inflação dá sinais de ceder. Na sexta-feira, o IBGE anunciou que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) foi de 0,49% em maio, ante 0,87% em abril. O IPCA é o índice utilizado no sistema de metas de inflação.

Há, porém, outra vertente da política econômica que poderia ser mais flexível, na avaliação do Planalto: a da politica fiscal. São crescentes as pressões para que Palocci acelere a liberação das verbas previstas no Orçamento. A falta de agilidade nessa área é apontada como uma das causas da rebelião da base governista.

Essa pressão tanto existe que, de Londres, Palocci mandou um recado aos colegas de governo. Ele disse que a crise preocupa e advertiu que, se ela contaminar a economia, os custos para a sociedade serão elevados. Por isso, afirmou, as bases da política econômica serão reforçadas, se necessário.

Hoje, a meta para as contas públicas é de 4,25% do Produto Interno Bruto (PIB). Mas, como informou o Estado em 3 de abril, a equipe econômica já trabalha por 4,5%. De janeiro a abril, o aperto foi muito mais intenso e as contas fecharam com superávit de 7,3%. O desempenho das contas públicas é o que mais irrita os ministros. A maioria já esteve no Planalto se queixando da falta de liberação de recursos para suas pastas.

O ataque frontal que o ministro José Dirceu desferiu à política econômica na semana passada, em Lisboa, teria sido nada menos do que a verbalização de uma insatisfação generalizada no governo, segundo assessores. "Se deixarem, fazem o superávit primário de 7%, juros de 20%", atacou Dirceu.

Em meio ao tiroteio, o presidente Lula pede "mais criatividade" para sair do dilema de juros altos e baixo crescimento. Segundo assessores, ele vem cobrando da equipe econômica uma taxa de crescimento vigorosa este ano, na casa dos 4%. O Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea) cortou sua projeção de aumento do PIB este ano, de 3,5% para 2,8%.