Título: Ex-mulher de Costa Neto deve revelar doação ilegal de R$ 2 milhões ao PT
Autor: Angélica Santa Cruz, José Maria Mayrink
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/06/2005, Nacional, p. A14

Citada pelo deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) em seu listão de pessoas que devem ser ouvidas pelo Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados - encarregado de apurar o suposto envolvimento de parlamentares no mensalão -, a publicitária Maria Christina Mendes Caldeira passou os últimos dias às voltas com preparações para enfrentar uma eventual sabatina em Brasília. "Ser for convocada, estou disposta a contar tudo o que sei", disse ela ontem ao Estado. Casada durante dois anos e meio com o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, ela tem sido apontada como testemunha com poder de fogo para inflamar o caso. A publicitária e Costa Neto protagonizaram uma separação conturbada em junho de 2004. Ela saiu acusando o ex de usar verbas do partido em proveito pessoal, relatando horrores domésticos, como o de ter ficado sitiada em uma casa com a luz cortada, e fazendo alusões à sexualidade do parlamentar. Ele respondeu com sete queixas-crime e dois processos cíveis todos em nome do PL.

Na tarde de ontem, Maria Christina esteve no escritório do criminalista Ademar Gomes - que assumiu sua defesa - aparando as arestas do que deve contar, se de fato for chamada a depor. O relato de Maria Christina deve ser testemunhal, baseado apenas em fatos que ela viu ou ouviu de seu ex-marido.

Há casos, por exemplo, em que a publicitária não sabe informar o nome completo das pessoas envolvidas ou mesmo a data precisa. "Isso não enfraquece o testemunho dela. É apenas o depoimento de uma mulher que testemunhou fatos que podem ajudar a esclarecer o que a comissão investiga. Ela pode ajudar muito dando pistas que depois devem ser apuradas", afirma Ademar Gomes.

Alegando que só pretende falar em testemunhos oficiais, a publicitária não quis dar entrevista. Autorizado por sua cliente, Gomes adiantou parte do que ela pretende contar se for chamada.

OPERAÇÃO TAIWAN

Um dos testemunhos da publicitária aponta para um suposto esquema de contribuição ilegal para a campanha de Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência da República. A doação teria sido feita pelo governo de Taiwan - e a triangulação teria sido desenhada por Valdemar Costa Neto, com o conhecimento de Delúbio Soares, o tesoureiro do PT acusado de pagar mesadas para deputados de partidos aliados. A doação seria de R$ 2 milhões - e pelo menos R$ 400 mil teriam ficado nas mãos do presidente nacional do PL.

Maria Christina disse ao advogado que soube da operação durante visita feita ao país em fevereiro de 2004. Na comitiva - que viajou a convite do governo de Taiwan - , estavam Costa Neto, Maria Christina e o senador Aelton Freitas (PL-MG). A publicitária, única do grupo fluente em inglês, serviu como intérprete nas conversas entre os brasileiros e as autoridades de Taiwan. Em um desses diálogos, um dos ministros daquele país cobrou de Valdemar os resultados da contribuição feita por seu país para financiar a campanha de Lula. Pressionado pela publicitária, Costa Neto teria lhe contado como funcionava o esquema. O senador Aelton Freitas, de acordo com ela, era apenas integrante da comitiva - e não tinha conhecimento da contribuição ilegal.

AMIZADE COM DELÚBIO

Maria Christina deve atestar o que classifica como relação estreita entre Valdemar Costa Neto e Delúbio Soares. O presidente do PL, vez por outra, reclamava que não era bem tratado pelo presidente Lula. Mas se referia a Delúbio como a um amigo.

Em janeiro de 2003, Costa Neto teria sido, por exemplo, um dos poucos políticos convidados a participar do aniversário do pai de Delúbio em uma fazenda em Buriti Alegre, Goiás. Maria Christina o acompanhou na viagem. Na volta da festa, o jato executivo Citation 525, que transportava o presidente do PL, sua mulher e dois pilotos, pousou no aeroporto de Congonhas, mas acabou derrapando e caindo em uma via de acesso à Avenida dos Bandeirantes. Na época, Valdemar declarou que o acidente aconteceu quando ele estava voltando de um encontro com representantes do partido.

OUTRAS AGÊNCIAS

Diante de parlamentares, Maria Christina também pretende dar pistas sobre a atuação de Valdemar na compra do apoio de deputados. As agências de publicidade apontadas por Roberto Jefferson não seriam as únicas que usam dinheiro de estatais para repassar a políticos. A publicitária teria ouvido menção a pelo menos mais uma, usada para comprar apoio de um partido nanico.