Título: O pacote do MEC
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/06/2005, Notas e informaçoes, p. A3

A última iniciativa do governo no campo do ensino, um conjunto de programas e projetos intitulado "Ações para a Qualidade da Educação", lançado pelo ministro Tarso Genro numa solenidade que contou com a participação do presidente da República, é pomposa no nome e ambiciosa nos objetivos, mas não traz maiores novidades em seu conteúdo. Várias medidas já haviam sido divulgadas antes pelo MEC e pelo menos uma está em vigor desde 1979.

Uma das medidas é a elevação de oito para nove anos na duração do ensino fundamental. O MEC justificou esse aumento em nome da "inclusão educacional de estudantes das camadas populares" e lembrou que os nove anos já são adotados pela Argentina, Uruguai, Chile, Costa Rica e Cuba.

Na realidade, esse é o período do ensino fundamental vigente em quase todos os países de origem hispânica, por influência espanhola. E, desde a criação do Mercosul, há 20 anos, Uruguai e Argentina vinham discutindo com o Brasil a uniformização das regras de funcionamento desse nível de ensino, para agilizar o processo de reconhecimento de diplomas. Com a crescente imigração de cidadãos entre esses países, os pais vinham enfrentando dificuldades burocráticas para matricular seus filhos em escolas públicas e privadas.

Outra medida positiva, e que também vinha sendo discutida há tempos, é a criação de bolsas de estudo para os programas de formação de professores do ensino básico da rede pública. Atualmente, há 230 mil docentes sem a formação exigida pela Lei de Diretrizes e Bases. A iniciativa mais surpreendente é a instituição do Programa de Educação Tutorial (PET), concebido para fomentar iniciação científica de estudantes de graduação, por meio de bolsas concedidas a alunos e professores-tutores.

Na realidade, os PETs já existem há 26 anos. Por ironia, foram criados pelo então diretor da Capes, Cláudio Moura Castro, hoje um dos principais críticos da gestão de Tarso Genro. Com o nome de Programa Especial de Treinamento, a idéia era dar tratamento diferenciado aos melhores alunos da graduação, permitindo-lhes estudar em tempo integral e os preparando para a pós-graduação. As mais importantes universidades do País converteram a iniciativa da Capes em instrumento de formação de elites acadêmicas.

É de se estranhar que o texto da medida provisória divulgado pelo MEC em seu site, apesar de manter as diretrizes do PET, não faça menção ao êxito de uma experiência que já dura duas décadas e meia. Por decidir ampliá-la, valorizando uma iniciativa tomada por governos passados, o ministro da Educação merece aplauso. Mas, ao silenciar sobre o mentor intelectual e a própria história desse programa, tratando-o como se fosse "obra" do atual governo, Tarso Genro incorre em mesquinharia.

Entre as demais medidas do Ações para a Qualidade na Educação, duas outras também merecem destaque. Uma é a criação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb). Por destinar investimentos federais crescentes até chegar a R$ 4,3 bilhões, em quatro anos, ele sofreu resistência do ministro da Fazenda, para quem o problema da educação não é a escassez de recursos para o setor, mas a falta de racionalidade na gestão das verbas existentes. Mas, como essa era uma promessa de campanha, Lula a endossou.

A outra medida é a criação do programa Escola de Fábrica, que prevê a abertura de cursos profissionalizantes dentro de empresas, favorecendo o ingresso de estudantes pobres no mercado de trabalho. Alguns especialistas se queixam da má redação do projeto, por não definir com clareza a responsabilidade das indústrias, enquanto outros temem que essa iniciativa se justaponha aos programas já existentes para contratação de aprendizes.

Como se vê, a última iniciativa do MEC é pretensiosa, tanto na forma quanto nos objetivos. E aquilo que ela tem de bom praticamente já existe. Por sua vez, o que tem de novo precisa ser detalhado. Infelizmente, a compulsão por lançar projetos em todos os níveis de ensino, sem detalhar sua implementação e sem precisar sua execução, tem sido a sina do MEC no governo do PT.