Título: Célula-tronco pode virar óvulo
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Fonte: O Estado de São Paulo, 20/06/2005, Vida&, p. A12

Cientistas britânicos acreditam que gametas humanos poderão ser obtidos em laboratório dentro de alguns anos

COPENHAGUE - Um estudo de cientistas da Grã-Bretanha sugere que células-tronco extraídas de embriões humanos podem realmente se desenvolver artificialmente em óvulos ou espermatozóides. A intenção é fornecer uma possibilidade de reprodução para casais inférteis sem que precisem usar gametas de doadores, além de ajudar no entendimento sobre as etapas iniciais do desenvolvimento humano. A pesquisa está em estágio preliminar - nenhum gameta humano maduro foi produzido no laboratório -, mas a equipe acredita estar no caminho certo. As células-tronco têm a capacidade virtual de formar qualquer tipo de tecido humano. Em uma experiência feita na Universidade de Sheffield, o pesquisador Behrouz Aflatoonian conseguiu diferenciá-las em um grupo celular chamado corpo embrióide a ponto de ver genes que "funcionam" em gametas se expressar. Em duas semanas de cultivo, surgiram algumas proteínas observadas em espermatozóides. A equipe, do Centro de Biologia de Células-Tronco da universidade, já havia produzido gametas de camundongos - passo dado também por outros laboratórios, como o prestigiado Instituto Whitehead, no Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), nos Estados Unidos. Os resultados do grupo britânico serão apresentados hoje na reunião da Sociedade Européia de Reprodução e Embriologia Humanas, que se realiza na Dinamarca. O impacto imediato, esperam os pesquisadores, é entender por que algumas pessoas não produzem gametas saudáveis, disse o cientista Harry Moore. O centro pretende investigar se poluentes químicos, como pesticidas que imitam a ação de hormônios, interferem na maturação de células germinativas e causam anomalias congênitas, infertilidade e câncer. "Ao usar testes adequados com células-tronco embrionárias, podemos estudar a ação desses produtos químicos no laboratório", declarou Moore. Contudo, o cientista afirma que muitos anos de pesquisa serão necessários até a produção de gametas, principalmente pela dificuldade ainda presente de fazer células-tronco embrionárias se diferenciarem no tecido que o pesquisador quer. "Precisaríamos provar que espermatozóides e óvulos produzidos dessa maneira são seguros antes de pensar em usá-los no tratamento de pacientes."

ÉTICA A especialista em ética médica do Imperial College em Londres, Anna Smajdor, acredita que essa linha de pesquisa abre "novas e desafiadoras possibilidades", como a utilização da técnica por casais gays que desejem filho com relação genética. Ela lembra que o óvulo poderia ser criado a partir de células-tronco retiradas de um embrião clonado com material doado por um paciente. Além disso, a fertilidade feminina não estaria limitada pela menopausa. "Tais possibilidades levantam questões sobre como definimos paternidade e como aplicaremos essa tecnologia", disse.