Título: Produtores antecipam venda de safra de soja
Autor: João Baumer
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/06/2005, Economia & Negócios, p. B16

Preço do produto acumula alta de 30% este ano na Bolsa de Chicago

A alta recente dos preços futuros da soja na Bolsa de Chicago acionou a negociação antecipada da safra futura do Brasil. As cotações acumulam valorização superior a 30% em 2005, e metade do ganho foi obtido nos últimos 30 dias. Apenas em junho, a alta é próxima de 10%. Na semana passada, os futuros alcançaram e consolidaram o patamar psicológico importante de US$ 7 por bushel, ou cerca de US$ 15,50 a saca de 60 quilos. Os preços melhores estimularam a venda antecipada pelo sistema de troca por fertilizantes, ou por adiantamento de parte do pagamento para financiar a lavoura. Normalmente, as compras antecipadas começam em maio em Mato Grosso, o primeiro Estado a plantar e colher o grão. Mas até meados de junho, os contratos para a safra nova previam apenas o volume a ser comprometido entre vendedor e comprador, não o preço. O mecanismo, tradicional no segmento de soja, ruiu no ano passado quando produtores romperam contratos de venda antecipada porque o preço havia subido muito entre a data da assinatura e a da entrega da mercadoria. Mesmo com esse risco, as grandes tradings multinacionais (Bunge, ADM, Cargill e Dreyfus) e o Grupo Amaggi estão fazendo compras antecipadas em Mato Grosso e no porto de Paranaguá. Em Mato Grosso, os preços de venda para a safra futura, a ser entregue entre março e maio, oscilam entre US$ 9,50 e US$ 11,20 a saca, conforme a localização das lavouras. Em Paranaguá, houve negócio na semana passada a US$ 14 a saca para março. Esses preços foram fixados após a forte alta recente dos futuros em Chicago, sustentada pela seca que ameaça a safra dos EUA. A Caramuru Alimentos, trading de capital nacional que compete com as grandes multinacionais do setor ao lado do Grupo André Maggi, não pretende realizar compras antecipadas. "O risco é muito grande, não pretendemos fazer. Mas vamos monitorar o mercado, e se o volume de operações de compra antecipada aumentar, é possível que façamos", diz César Borges de Souza, do Conselho de Administração da empresa. O presidente do Grupo Amaggi, Pedro Jacyr Bongiolo, diz que o nível de inadimplência de fornecedores de soja é muito baixo na companhia, e que as operações de compra antecipada dependem muito mais das condições de mercado, que se tornaram favoráveis com a alta recente dos preços em Chicago. "O grupo atua em Mato Grosso há mais de 20 anos, e tem um critério rigoroso de seleção para a compra antecipada da safra futura. Esse tipo de operação é o mesmo que dar crédito, daí a necessidade de um bom cadastro", diz. O grupo compra soja antecipadamente por meio do sistema de trocas e de adiantamento em dinheiro. Esta semana, fechou preços entre US$ 10,20 e US$ 10,50 a saca nas regiões da BR-163 e do noroeste de Mato Grosso, para pagamento em produto no início de 2006. "A retomada da venda antecipada está ocorrendo normalmente, sem traumas em relação ao que ocorreu no ano passado, quando alguns produtores romperam com as tradings", diz Gustavo Gonçalves, presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Soja. Ele admite, contudo, que o agricultor precisa recuperar sua credibilidade com as companhias. "Estamos enfrentando séria dificuldade em contrair financiamentos para a safra nova nos bancos, daí a necessidade de vender antecipadamente parte da produção para as indústrias e exportadores", diz. Para Gonçalves, a decisão de plantio da safra nova será tardia este ano, dada a lentidão da venda de insumos e a crise do setor. O analista de mercado Anderson Galvão Gomes, da consultoria mineira Céleres, diz que as tradings tendem a manter o relacionamento com os agricultores, que são seus fornecedores, mas devem fazê-lo de modo seletivo: "As empresas estão conscientes do risco que correm, e o produtor rural deveria ter juízo e respeitar um contrato assinado livremente por ele antes do plantio". No caso do milho, as perspectivas para o plantio ainda são incertas. Diferentemente da soja, não ocorre venda antecipada do cereal. Assim, os produtores que optam pelo plantio têm de se basear nos preços praticados no mercado físico para estimar quanto receberão no futuro. No presente, a relação de preços entre o milho e a soja é favorável à última. Isso ocorre quando duas sacas de milho valem mais do que uma saca de soja, situação do momento no Paraná, maior produtor de milho do País. Contudo, o cenário para o plantio naquele Estado ainda é nebuloso, segundo Flávio Turra, analista da Organização das Cooperativas do Estado do Paraná (Ocepar). "Os produtores estão adiando a decisão de plantio, e isso se reflete no volume baixo de compra de insumos", afirma.