Título: Ex-KKK pega 60 anos por morte de ativistas em 1964
Autor: Paulo Sotero
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/06/2005, Internacional, p. A20

Os 80 anos de Ray Killen e seu frágil estado de saúde não comoveram juiz; caso inspirou filme 'Mississippi em Chamas'

Edgar Ray Killen, ex-membro da organização racista Ku Klux Klan, foi sentenciado ontem a 60 anos de cadeia quatro décadas depois de ter orquestrado o brutal assassinato de três ativistas que trabalhavam no registro de novos eleitores negros no Estado americano de Mississippi. Os 80 anos de idade de Killen e seu precário estado de saúde não comoveram o juiz Marcus Gordon. "Cada vida tem valor", afirmou Gordon depois de pronunciar as sentenças de 20 anos de prisão pela morte de cada uma das três vítimas. Killen recebeu a punição em silêncio, sentado na cadeira de rodas que usa há anos, desde que sofreu um acidente numa companhia madeireira na qual trabalhava. Os jovens James Earl Chaney, um negro de Mississippi, de 21 anos, Michael Schwerner, de 24, e Andrew Goodman, de 20, ambos judeus nova-iorquinos, foram espancados e mortos por uma gangue do KKK em 21 de junho de 1964 no Condado de Neshoba e enterrados numa fazenda. Noticiado com destaque pelos telejornais, o crime chocou o país. A reação nacional de repúdio deu novo ímpeto ao movimento dos direitos civis e gerou a pressão que levou, algumas semanas mais tarde, a aprovação da histórica Lei Sobre o Direito de Votar, que tornou efetivo o conceito do voto universal nos Estados Unidos. O crime, porém, permaneceu sem punição. Inicialmente, as autoridades locais sustentaram que o desaparecimento dos três jovens não passava de teatro político inventado pelos próprios para atrair simpatizantes para a sua causa. A descoberta dos corpos, dias depois dos assassinatos, não alterou a disposição dos poderosos do lugar de proteger os assassinos. Em 1967, Killen e outros 17 suspeitos foram indiciados. Mas o júri ficou em impasse quanto a um veredicto. Dramatizado em 1988 no filme Mississippi em Chamas, o caso foi reaberto em 2004 com a convocação de um novo Grande Júri popular contra os oito suspeitos sobreviventes. Desta vez, porém, só Killen foi indiciado. Na terça-feira ele foi declarado culpado do crime de homicídio culposo (sem intenção de matar), depois que o júri de nove brancos e três negros chegou a um impasse sobre uma condenação mais severa pedida pelo promotor, por homicídio doloso (com intenção de matar). Numa coincidência carregada de significado histórico, na segunda-feira, quando começou o julgamento, o Senado dos EUA aprovou uma resolução pedindo desculpas ao país por não ter adotado nenhuma das mais de 200 propostas de resolução de condenação dos linchamentos de negros apresentadas na primeira metade do século 20. Segundo estudiosos do tema, a omissão do Senado americano foi responsável por pelo menos algumas centenas dos 4.700 linchamentos documentados em todo o país entre 1882 e 1968.