Título: PSDB está pronto a ajudar Lula a sair da crise, diz FHC
Autor: Carlos Marchi
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/06/2005, Nacional, p. A16

Mas ressalva que a primeira iniciativa para uma colaboração com o governo tem de partir do próprio presidente

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse ontem que ele e seu partido, o PSDB, "estão prontos para conversar com o governo" e ajudá-lo a sair da crise. Mas ressalvou que a primeira iniciativa para uma colaboração tem de partir do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. "O presidente não tomou a iniciativa", disse, em entrevista ao programa Conexão Roberto Dávila, que vai ao ar hoje, às 22h30, na TV Cultura de São Paulo e na TVE do Rio. FHC afirmou que não será possível vencer a crise sem apurar tudo, sem restrições; o segundo é o presidente mostrar um caminho. "Do jeito que está não dá mais para seguir", alertou. Ele se disse muito preocupado com a crise política e com algumas tentativas de mobilização adotadas por setores do PT, afirmando que o País "não pode se dividir". "O País quer diálogo", recomendou.

Segundo ele, "a oposição não quer colocar em risco o presidente Lula". Ao final da entrevista, numa frase cheia de metáforas, FHC disse que "os símbolos devem ficar como símbolos, para serem preservados". E sintetizou: "Às vezes, você arrisca muito quando o símbolo começa a se rotinizar".

'GOVERNE' O ex-presidente disse que uma conversa institucional do PSDB com o governo nunca deu certo "porque nós fomos definidos como adversários pelo PT antes que o fôssemos, de fato", diagnosticou. "Nós não queremos o 'fora Lula', mas, por favor, governe", prosseguiu. Ele afirmou enfaticamente que o governo errou quando tentou controlar a apuração das denúncias do mensalão e que agora só tem uma saída - apurar tudo. "E é bom para o governo que se apure", avançou, prevendo: "Depois de começar, não segura mais". Insistiu em dizer que ele não quer "que Lula se frite" e advertiu: "Mas corre o risco". FHC admitiu, contudo, que há evidências de que o governo está perdido. "Eu reconheço que foi até grosseiro eu usar a expressão 'peru bêbado', mas que está tonto, está", arriscou. Ele reconheceu que, para o presidente, é "muito difícil" agüentar a pressão de um momento de forte crise: "Tem de tomar as decisões mais dramáticas sozinho. Para isso, é preciso ter convicção, autoconfiança e generosidade", salientou.

CAMPANHA A crise atual, opinou, "veio de um lado que ninguém esperava". E salientou: "A mim, me custa aceitar o PT acusado de corrupção por todos os lados." Para 2006, FHC desfiou uma agenda de campanha, citando pontos que, a seu juízo, a sociedade brasileira quer concretizar com a máxima urgência. O ponto mais importante, segundo ele, é a questão da segurança pública, que deve ganhar um enfoque nacional. Os outros pontos vitais da próxima campanha, para ele, serão educação e infra-estrutura. Na entrevista, ele admitiu que só seria candidato em uma situação extrema de crise. "O meu partido tem uma fieira de bons candidatos, um de cada geração", disse, citando quatro que têm uma diferença de mais ou menos dez anos entre si: ele, o prefeito José Serra e os governadores Geraldo Alckmin e Aécio Neves. Disse que prefere continuar operando como conselheiro e consultor, e admitiu que é bom voltar à profissão depois de ser presidente. "Eu voltei a dar aulas. Vamos ver se Lula volta à fábrica", ironizou. Embora ressalvando que não queria dar palpites, ele registrou o que considera sejam erros do governo Lula. Para ele, o primeiro equívoco foi misturar Casa Civil com coordenação política. "Não pode juntar as duas. O coordenador político é como fusível, se queima e a gente troca. A Casa Civil existe para negar o que os políticos pedem", ponderou. Outro erro, segundo ele, foi o governo fazer fortes liberações de crédito num momento em que a inflação ameaçava recrudescer. "Existe aí uma contradição: liberar o crédito joga dinheiro na sociedade e estimula o consumo." Por isso, lembrou, o governo se enroscou na obrigação de continuar mantendo taxas de juros altas. Um terceiro equívoco, segundo ele, foi dar "sinais contraditórios" para os investidores internacionais na questão das agências reguladoras. "Ninguém investe bilhões de dólares se não encontrar regras muito claras", advertiu. Foi por isso, segundo ele, que a taxa de investimentos caiu este ano. Além disso, observou, "o espetáculo do crescimento desapareceu". Por último, criticou arroubos na política externa do governo Lula, afirmando que o Brasil tem sido "arrogante", não tem força para confrontar os EUA e tem criado desconfianças nos países vizinhos.