Título: Palocci entra em campo para evitar que crise afete economia
Autor: Sheila D'Amorim Isabel Sobral
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/06/2005, Nacional, p. A4

Escalado pelo Planalto, ministro dá entrevista de uma hora e meia e diz que "problemas políticos se resolvem no campo político"

A crise política não será combatida com medidas econômicas, afirmou ontem o ministro da Fazenda, Antonio Palocci. "Problemas no campo político se resolvem no campo político. Problemas econômicos, no campo econômico", disse, durante entrevista convocada para anunciar a meta de inflação para 2006 e 2007. "Se temos, hoje, uma questão no campo ético, temos que tratá-la dentro de procedimentos ético das instituições." Em atitude interpretada como um esforço para acalmar os investidores, Palocci deteve-se mais do que o esperado nos comentários sobre a crise provocada por denúncias de corrupção, desvinculando o nervosismo político das discussões sobre aperto fiscal ou taxa de juros. Durante uma hora e meia de entrevista, o ministro destacou várias vezes que "a política econômica não é espasmódica e não reage a pressões". Afirmou ainda que todas as áreas caminharão bem se forem usados "instrumentos adequados para apurar irregularidades que não estão no campo econômico". E desconversou quando perguntado sobre como deveria ser o relacionamento do governo com o PT, a partir de agora, para evitar interferências das questões política na economia. Mostrando bom humor, disse que não faz parte da articulação política do governo e que só fala sobre o tema quando é consultado. "Eu não sou da área política. Não é minha área de preferência. Primeiro, vem a medicina; em segundo lugar, a economia e, por último, a política." No entanto, mostrou ter mais jogo de cintura do que muitos companheiros de governo para lidar com fogo amigo e evitou polêmica com a nova ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff. No seu segundo dia de trabalho substituindo José Dirceu, a ministra criticou a política econômica ao defender que a realização de aperto fiscal acima da meta prevista é algo "desnecessário e constrangedor". Para Palocci, o mais importante é destacar que a ministra se comprometeu a cumprir o orçamento programado. "Pode parecer estranho, mas no Brasil é bom falar porque a história é de não cumprir o orçamento", comentou. "Só posso saudar a ministra", completou, se esquivando de responder se o atual esforço fiscal programado é suficiente para garantir a redução da dívida e assegurar mais crescimento no longo prazo. Em vez disso, Palocci saiu em defesa de Dilma e Dirceu. Este último é freqüentemente apontado como principal autor de disparos de fogo amigo contra a política econômica. "É injusto com Dilma e Dirceu (tratá-los como críticos da economia). Na Casa Civil, ele (Dirceu) fez uma grande trincheira de apoio à política econômica. Duas ou três vezes ele fez comentários contrários que não anulam o esforço e apoio dado", afirmou. Palocci fez defesa veemente da política econômica e usou e abusou da linguagem médica, sua especialidade, para dizer que o governo tenta evitar momentos de crise no País, como no passado. "Nosso trabalho tem sido olhar quais as medidas preventivas um país que busca ser um corpo saudável deve ter para resultar num organismo cujo sistema circulatório, esquelético, muscular e, principalmente imunológico, esteja preparado para atravessar período de chuvas fortes, ventos uivantes, e tormentas que sempre acontecem na vida das pessoas e de todas as sociedades." O ministro só ficou sem jeito quando foi insistentemente questionado sobre o destino do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, na reforma ministerial que está sendo definida pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Nos bastidores do governo, a substituição de Meirelles é dada como certa. Ontem, apesar de ter participado da reunião do Conselho Monetário Nacional (CMN), Meirelles não estava na entrevista para divulgar a meta de inflação para 2007, como sempre aconteceu nos anos anteriores. Palocci foi acompanhado do diretor de Política Econômica do BC, Afonso Beviláqua, e do secretário-executivo do ministério, Murilo Portugal, nome mais cotado para assumir o comando do BC. Apesar de admitir que tem ajudado Lula na reforma que será anunciada nos próximos dias, argumentou que não podia fazer comentários. "Não é adequado. Não é justo. O presidente Lula terá todo nosso apoio para fazer os ajustes necessários", disse, ressaltando que não está no governo para julgar pessoas, mas para ser julgado também. "Sou ministro, estou sempre em julgamento. Não posso julgar ninguém", afirmou, se retirando rapidamente da sala de entrevistas.