Título: Financiamento de campanha
Autor: Celso Ming
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/06/2005, Economia & Negócios, p. B2

Campanha eleitoral, nos moldes praticados hoje, custa o olho da cara: produções de TV, contratação de marqueteiros e de profissionais especializados, veículos, despesas com passagens aéreas, showmícios, festas, cabos eleitorais, faixas, cartazes, "santinhos" e promoções mil.

Só para as eleições de 2002, foram gastos cerca de R$ 9 bilhões, calcula o deputado federal Rubens Otoni (PT-GO), relator do projeto de Reforma Política. Um candidato a presidente ou a governador gasta cerca de R$ 35 milhões; a senador, R$ 15 milhões; se já tiver base eleitoral, um candidato a deputado federal gasta R$ 2 milhões; se não tiver, o dobro. Você sabe: há os recursos oficiais e os "por fora".

Uma vez eleito, o político assume o mandato quase falido. Tem quatro anos para refazer seu caixa para as eleições seguintes. Então, acontece de tudo, cargos públicos e contratos das estatais são envolvidos na operação. Corrupção tem muitas causas, uma delas é esse esquema aí. É também por isso que as obras públicas ficam tão caras e porque o termo "mensalão" ganhou notoriedade.

Uma das propostas para controlar a praga é o financiamento público de campanha. O orçamento reserva verba para cobertura de despesas eleitorais que, supostamente, é bem mais baixa, de cerca de R$ 7 por eleitor, o que, para a União, daria menos de R$ 1 bilhão. A verba seria distribuída aos partidos, de acordo com regras a serem definidas pela Justiça Eleitoral.

Para que isso funcione, seria preciso instituir o princípio do "voto na legenda". Nas eleições proporcionais (para deputado federal, estadual e vereador), o eleitor não votaria mais no candidato; votaria no partido. Seria eleito quem fosse previamente apontado em lista aprovada em convenção partidária. Se o partido conseguir 17 cadeiras, estarão eleitos os primeiros 17 da lista. Nesse sistema caberia, também, a adoção do voto distrital, mas este é outro assunto.

Uma excelente conseqüência seria o aumento da importância dos programas de cada partido. Outra, desapareceria a sofreguidão dos candidatos para mostrar a cara mais do que o outro na corrida pela conquista do eleitor. As despesas eleitorais cairiam e acabaria a necessidade do avanço imoral sobre os recursos públicos.

Quatro são as principais objeções. A primeira é a de que a briga entre os candidatos se deslocaria para dentro dos partidos, pelos primeiros lugares na lista. Isso poderia criar novas distorções e até mesmo corrupção. A resposta a isso é que os candidatos acabariam se vigiando mutuamente para garantir lisura nas convenções, desde que as denúncias fossem imediatamente julgadas.

A segunda objeção é a de que o político deixaria de ser o representante do seu eleitor, que não poderia cobrá-lo por posições assumidas antes ou por omissões no desempenho do mandato. Responde-se: são raros os brasileiros que hoje cobram do político compromissos assumidos no tempo de candidato.

Terceira, não há, no Brasil, cultura de voto em legenda. Como mais da metade dos eleitores não se identifica com partidos, a eleição assim concebida perderia significado. Responde-se: o eleitor teria de ser preparado para a mudança e a sociedade teria de contar com o amadurecimento do eleitor, o que só viria com o tempo.

Quarta objeção: se posta em prática, essa proposta colocaria em risco o atual patrimônio eleitoral dos políticos. Por isso, eles a rejeitarão. Resposta: por serem mais conhecidos, esses políticos encabeçariam a lista do partido.

Há mais objeções. Nesta hora de CPIs, denúncias e lavagem de roupa suja, esta é pelo menos uma boa discussão.