Título: RFFSA sobrevive. E despesa aumenta
Autor: Sérgio Gobetti
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/06/2005, Economia e Negócios, p. B7

BRASÍLIA - A Rede Ferroviária Federal (RFFSA) teima em existir, quase uma década depois de encerrado o processo de privatização das estatais. A empresa parou de operar em 1999, mas o governo não conseguiu extingui-la. No lento processo de desaparecimento, causa despesas de R$ 1,3 bilhão ao ano, com o pagamento de 96 mil aposentados. A Rede tem patrimônio de R$ 19,1 bilhões em trilhos, locomotivas e vagões imobilizado pelo Programa Nacional de Desestatização (PND). O governo Luiz Inácio Lula da Silva tentou acabar de vez com a Rede, editando uma Medida Provisória (MP) em abril passado. O Congresso, porém, rejeitou a MP na quarta-feira. E a Rede, que tinha deixado de existir, "ressuscitou". Agora, o governo precisará negociar o fim da empresa por projeto de lei.

Sobreviventes do processo de privatização e liquidação, 580 funcionários continuam batendo ponto nas repartições da RFFSA, esperando a aposentadoria promissora. Uma lei aprovada no governo Collor garante a eles uma complementação de aposentadoria igual à diferença entre o salário da ativa e o valor recebido do INSS. Têm a receber, ainda, a contribuição que recolheram ao seu fundo de pensão, o Refer.

A mesada paga pelo Tesouro aos aposentados custa hoje R$ 1,3 bilhão por ano - cerca de R$ 1 mil mensais por cabeça. Além disso, a RFFSA paga com os próprios recursos - oriundos da venda de imóveis e do arrendamento de trilhos e equipamentos - mais R$ 48,6 milhões para os 580 trabalhadores que continuam em atividade. Ao valor da folha, somam-se outros R$ 100 milhões em custos operacionais, como o pagamento de contas de água e luz e a remuneração de 38 escritórios de advocacia que defendem a estatal em ações judiciais.

Nos últimos 5 anos e meio, o prazo para concluir o processo de liquidação da Rede já foi prorrogado 11 vezes. A cada ano, a dívida cresce - de R$ 4,7 bilhões em 1999 para R$ 13,6 bilhões em 2004 - e seu patrimônio se deteriora. Mas os sindicatos de ferroviários continuam sonhando com o dia em que a Rede voltará a operar, assumindo eventualmente uma concessão exercida atualmente pelo setor privado.

"A Rede é um cadáver na sala, que cada dia fede mais. É uma ilusão pensar que algum dia poderá se revitalizar", afirma um técnico do Ministério do Planejamento.

Em abril, o governo baixou medida provisória que extinguia a empresa, transferia o patrimônio à União e repassava todos os equipamentos para uma outra estatal, a Valec, responsável pela construção da Ferrovia Norte-Sul. Os 580 funcionários seriam cedidos para o Ministério dos Transportes, onde seria criada uma Diretoria de Infra-Estrutura Ferroviária. Os aposentados manteriam os benefícios especiais.

Apesar das concessões, a MP foi rejeitada. O governo teve de editar imediatamente um decreto para convocar uma nova assembléia de acionistas e restabelecer o processo de liquidação. Até o final do ano, dizem os técnicos, o governo tentará negociar um novo projeto de lei para estabelecer as regras de extinção da Rede.

Enquanto isso, o governo imporá novo ritmo à liquidação, começando pelo recadastramento dos 96 mil aposentados, cujo pagamento passa a ser de responsabilidade da Secretaria de Recursos Humanos do Ministério do Planejamento, que assumirá o processamento da folha de pessoal.