Título: Saques eram feitos na véspera de reuniões com PT, diz secretária
Autor: Ana Paula Scinocca Guilherme Evelin
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/06/2005, Nacional, p. A4

Em depoimento no Conselho de Ética da Câmara, Karina afirma que aceita acareação com qualquer um dos envolvidos

SAQUES: Boys da agência SMPB, de Belo Horizonte, sacavam o dinheiro no Banco Rural. Karina identifica um deles como Marquinhos. "Era sacado muito dinheiro na véspera de Marcos Valério ir a Brasília." De vez em quando, um motorista identificado como Neildo levava os boys ao banco MALA: As funcionárias Simone Vasconcellos - gerente-financeira da SMPB - e Geiza Dias dos Santos - "braço direito" de Simone - recebiam e organizavam o dinheiro em malas BRASÍLIA: Simone Vasconcelos ia com Marcos Valério - que viajava em avião do Banco Rural - para Brasília e ficava o dia inteiro no Hotel Grand Bittar, separando as quantias a serem entregues. "Era um entra e sai de homens e ela dizia que estava muito cansada" AMIGOS: Karina disse que "nunca ouviu falar que o dinheiro era para deputados" . "Valério dizia que o dinheiro era para amigos de Brasília" JOSÉ DIRCEU Deputado (PT-SP) e ex-ministro da Casa Civil SILVIO PEREIRA Secretário-geral do PT DELÚBIO SOARES Tesoureiro do PT HENRIQUE PIZZOLATTO Diretor de Marketing do Banco do Brasil JOSÉ AUGUSTO DUMONT Ex-presidente do Banco Rural Ana Paula Scinocca Guilherme Evelin Colaboraram: Jander Ramon e Alex Capella BRASÍLIA

Fernanda Karina Ramos Somaggio, ex-secretária do publicitário Marcos Valério, revelou ontem em depoimento ao Conselho de Ética da Câmara que os saques de alto valor, em dinheiro, nas contas da agência SMPB ocorriam às vésperas de reuniões dele com a cúpula do PT. "Os boys iam buscar o dinheiro no Banco Rural e no Banco do Brasil no dia anterior (ao dos encontros)", afirmou Fernanda Karina. "Ele (Valério) só dizia que era para os amigos de Brasília."

"O que sei é que quando ele (Valério) vinha a Brasília o dinheiro era sacado. Ele vinha em avião fretado", revelou, contando que o avião era oferecido pelo Banco Rural. "Sei disso porque era eu quem marcava o vôo", explicou no depoimento, que começou por volta de 15 horas e acabou pouco depois de 20 horas. No fim, ela disse que aceita acareação com qualquer dos envolvidos nas denúncias.

Levantamento do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), do Ministério da Fazenda, mostra que foram sacados quase R$ 21 milhões das contas da SMPB e da DNA, outra agência da qual Valério é sócio. Os saques eram feitos, segundo Fernanda Karina, antes de reuniões de Valério com o tesoureiro do PT, Delúbio Soares, e o secretário-geral do partido, Silvio Pereira, marcadas por ela nos hotéis Blue Tree Tower, em Brasília, e Sofitel, em São Paulo.

Karina recuou em relação à entrevista reproduzida pela revista IstoÉ Dinheiro, na qual diz ter visto a saída de malas de dinheiro da agência. Ela contou nunca ter acompanhado os saques bancários nem visto Valério com dinheiro, e baseia suas afirmações apenas em relatos de colegas de trabalho. Ao falar em supostas "negociatas", resumiu: "São impressões minhas."

A informação sobre os saques, corrigiu, foi dada por boys e duas funcionárias do departamento financeiro da SMPB . "Eu não trabalhava no departamento financeiro. A própria Simone (Vasconcellos, gerente financeira da SMPB) chegou a comentar que estava cansada de ficar em hotel contando dinheiro, com entra-e-sai de homem."

Karina informou que Simone era responsável pela partilha do dinheiro nas visitas de Valério a Brasília. E cumpria essa tarefa em quartos do Hotel Grand Bittar, onde se hospedava.

Em outro trecho, Karina disse que às vezes o dinheiro era repartido na sede da SMPB, em Belo Horizonte. "Aí ele (Valério) ia à empresa e pegava o dinheiro que a Simone separava. Saía com o dinheiro na mala" - outra informação que atribuiu a relatos de ex-colegas. Além dos boys, identificados como Marquinhos e Orlando, e de Simone, outra funcionária, Geiza Dias dos Santos, tinha conhecimento dos saques em dinheiro vivo

Ela disse que Valério "falava todos os dias" com Delúbio e Pereira e conversava por telefone, "eventualmente", com o deputado José Dirceu, ex-ministro da Casa Civil. "As ligações para Dirceu eram feitas para São Paulo. Eu pedia a alguém que desse retorno para Valério. Para o gabinete dele liguei só uma vez." Karina citou encontros freqüentes do publicitário com Henrique Pizzolato, diretor de marketing do Banco do Brasil. A DNA tem a conta do BB. Ela, pessoalmente, nunca viu Dirceu, Delúbio ou Pereira. Disse também não ter ouvido falar em "mesada, mensalão ou no deputado Roberto Jefferson". Sobre parlamentares, contou apenas saber que Valério falava com João Paulo Cunha (PT-SP), ex-presidente da Câmara, e João Magno (PT-MG), que era cliente da SMPB.

Em Belo Horizonte, a SMPB e seus funcionários não quiseram comentar as afirmações de Karina. A agência informou que Valério dará todas as explicações ao depor. E que os funcionários não viram necessidade de comentar, pois Karina não disse nada diferente de suas entrevistas anteriores.