Título: Jefferson fala, Brasília balança e já são 15 crimes para o País investigar
Autor: Luciana Nunes Leal
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/07/2005, Nacional, p. A10

Além de um elenco cada vez maior de suspeitos, a investigação sobre um suposto esquema de corrupção envolvendo o poder público e empresas privadas revelou uma extensa lista de crimes, que prevêem desde penas brandas, como pagamento de multa, a até 12 anos de prisão. "A corrupção na máquina administrativa tem uma teia gigantesca, com fatos entrelaçados que geram mais e mais delitos. Até agora, existem indícios fortes e veementes que precisam ser comprovados", diz o criminalista Ademar Rigueira, conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

Advogados e parlamentares com experiência jurídica listaram pelo menos 15 crimes que deverão ser investigados pelas comissões do Congresso, pela Polícia Federal e pelo Ministério Público. Tudo começa com infração ao Código Eleitoral.

"O deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), com suas denúncias, montou uma teia de elementos, mas, por si só, não são provas. O único provado, até agora, foi o crime eleitoral, confessado por ele mesmo. Mas, mesmo com a confissão, ainda são necessárias mais provas", afirma Rigueira. Jefferson admite que recebeu R$ 4 milhões para serem distribuídos a candidatos de seu partido nas eleições do ano passado e não declarou a quantia na prestação de contas da campanha. Para a Justiça Eleitoral, é crime de falsificação de documento público, com pena de até seis anos de prisão e pagamento de multa.

FERIDAS EXPOSTAS

A maior parte dos crimes, porém, está no Código Penal. Corrupção ativa e corrupção passiva são os mais graves. "Pela primeira vez, o sistema de corrupção começa a surgir com todas as feridas expostas. É como um duto. A cadeia começa com nomeação por parte de políticos de pessoas de confiança para as estatais. Começam então as fraudes, que levam à contratação de empresas privadas, para onde vai o dinheiro público. Esse dinheiro privado, sem origem comprovada, é sacado e volta sob forma de propinas ou pagamento de mesadas a parlamentares", diz a juíza aposentada e deputada Denise Frossard (PPS-RJ), da CPI dos Correios.

Denise lembra que é preciso produzir provas para cada uma dessas etapas. Se comprovada a rede de ilegalidades, a juíza aponta o crime de formação de quadrilha. "Quadrilha ou bando se forma quando mais de três pessoas se organizam para praticar crimes. É preciso que haja tarefas determinadas e um comando. Vejo um esboço de organização criminosa, que funciona como empresa, com hierarquia e pagamentos", afirma.

Foi com base no artigo 288 do Código Penal, que fala sobre formação de quadrilha, que a juíza, em decisão inédita, condenou 14 bicheiros do Rio, em 1993, a seis anos de prisão. "Na época, não havia lei contra a lavagem de dinheiro. Não tinha provas dos homicídios e de nenhum outro crime. Mas, na formação de quadrilha, basta a intenção", lembra Denise.

LAVAGEM

Segundo a juíza, a lavagem é outro crime que vai aparecer em algum momento da investigação, já que suspeitos como o publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza - acusado de ser o principal operador do mensalão - teriam dificuldades para provar a origem do patrimônio das suas empresas.

O crime de lavagem de dinheiro, em geral, vem acompanhado da sonegação fiscal, prevista na Lei de Crimes contra a Ordem Tributária. Juntas, as penas dos dois crimes podem chegar a dez anos de prisão.

O deputado petista Antônio Carlos Biscaia (RJ), outro responsável pela prisão dos bicheiros, pois chefiava o Ministério Público do Rio no período da investigação e da condenação, diz que as denúncias de Jefferson já deveriam estar sendo investigadas pelo Ministério Público Federal. "Não tem de aguardar o resultado da CPI. O MPF já deveria ter instaurado procedimento para convocar Jefferson. Seria um interrogatório técnico, não feito por colegas que elogiam a coragem de um cidadão como esse."

Calúnia, tentativa de extorsão, fraude em concorrência pública, condescendência com o crime e peculato (apropriação de dinheiro público) são outros atos ilícitos a serem investigados. "De tudo o que foi dito até agora, se só puder ser comprovado 10%, já é o suficiente para evidenciar que a Nação está enferma e a enfermidade é de malignidade letal", constata o ex-ministro da Justiça e ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Paulo Brossard.