Título: Ações da PF abrem crise entre OAB e juízes
Autor: Fausto Macedo
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/07/2005, Nacional, p. A13

Os juízes federais não vão permitir que a categoria seja submetida a um "linchamento público" por causa dos arrastões da Polícia Federal no combate ao crime organizado. A advertência foi feita pelo presidente da Associação dos Juízes Federais, Jorge Antonio Maurique. Ele reagiu às acusações de advogados que atribuem a magistrados expedição de mandados de busca "genéricos", sem especificar o que deve ser apreendido. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) tem feito duras críticas à PF e aos juízes. "O que não podemos aceitar é essa tentativa de intimidação que a OAB está fazendo contra os juízes", afirmou Maurique. "Estão tentando plantar em nós uma rubrica de demônios, o que não somos. Querem criar uma animosidade como se estivéssemos desrespeitando a Constituição. O juiz jurou respeitar a Constituição e assim procede." Desde que a PF inaugurou a sucessão de blitze contra organizações supostamente envolvidas em lavagem de dinheiro, evasão de divisas e corrupção - mais de 60 ações em dois anos -, a cúpula da OAB protesta contra os juízes que autorizam buscas em escritórios. Munidos de ordem judicial, os agentes carregam arquivos e computadores que guardam dados de clientes que não são alvo da investigação, diz a OAB.

"Essa insurgência da OAB não tem encontro na realidade porque não há invasão de escritório de advogado, não existe quebra de prerrogativas", ressalta. "O que existe são mandados de busca e apreensão despachados por juízes que apreciam os pedidos da autoridade policial." Maurique anotou que nem todos os pedidos da PF são acolhidos. "Alguns são deferidos, outros não."

Ele disse que a toga "está aberta" para debater com os advogados, mas assinalou: "O juiz não autoriza abusos e arbitrariedades." Maurique observou que os juízes não autorizam que a polícia execute as operações acompanhada de fotógrafos de jornais e câmaras de TV. "Os juízes não autorizam espetáculos, estamos fazendo o nosso trabalho de forma correta e respeitamos a OAB como instituição séria que é. Essas tentativas isoladas de jogar a população contra o Judiciário são antidemocráticas, um desrespeito ao Judiciário."

Maurique destacou que escritório é inviolável, nos termos da lei. "O que não é possível imaginar é que na apuração de crimes graves exista território imune à ação estatal."

Sérgio Fernando Moro, juiz federal em Curitiba, especializado no julgamento de ações sobre lavagem de dinheiro, observou que constata "uma certa distância entre o discurso da OAB e a realidade". Moro desencadeou em setembro a Operação Farol da Colina, que levou à prisão os 62 maiores doleiros do País. "A comunicação entre o cliente e o advogado realmente deve ser protegida contra intromissões, ainda que por ordem judicial", pondera o magistrado. "Não é possível interceptar conversa telefônica entre advogado e o seu cliente. A exceção se dá quando o próprio advogado é o criminoso ou quando participa do crime, por exemplo orientando o cliente à sua prática. Nos EUA é assim, a doutrina permite intromissão na relação advogado/cliente nessa hipótese."

Para Moro, "se o cliente entrega ao advogado prova do crime, o fato de ela estar no escritório não a torna imune à busca e apreensão". Ele considera que os mandados "devem ser os mais específicos possíveis".