Título: Interventores pedem recuperação judicial da Vasp
Autor: Mariana Barbosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/07/2005, Economia & Negócios, p. B12

Com a medida, ficam automaticamente suspensos os mais de 50 pedidos de falência contra a empresa que tramitam nos tribunais

A comissão de intervenção da Vasp entrou ontem com pedido de recuperação judicial, dentro da Lei de Recuperação de Empresas, a nova Lei de Falências. O pedido foi distribuído para a 1.ª Vara de Falência e Recuperação de Empresas, presidida pelo juiz Alexandre Lazzarini, que também está cuidando do caso Parmalat. Segundo o interventor interino, Reginaldo Alves de Sousa, não havia alternativa que não a de recorrer à recuperação judicial. "Estávamos sem saída diante dos inúmeros pedidos de falência e da falta de dinheiro para investir na empresa para que a gente possa voltar a prestar serviços", afirmou.

Com a medida, ficam suspensos os mais de 50 pedidos de falência contra a empresa que tramitam nos tribunais. A Justiça deve decidir se defere ou não o pedido de recuperação na semana que vem. Segundo o advogado da Vasp e assessor jurídico da comissão de intervenção, Pedro Morel, a ação conta com o respaldo do juiz do Trabalho, Homero Batista da Silva, e do Ministério Público trabalhista. A reportagem tentou entrar em contato com o juiz e com o MP, mas não os localizou.

A decisão de apelar para a Lei de Falências foi tomada ontem cedo, após consulta com cerca de cem funcionários que ainda trabalham na empresa e que assinaram um manifesto de apoio. O deputado federal Osvaldo Biolchi (PMDB-RS), relator da nova lei, fez uma apresentação sobre seus principais pontos durante a assembléia, na sede da empresa, em São Paulo.

Caso o pedido seja deferido, a empresa terá 60 dias para apresentar um plano de recuperação e 4 meses para aprová-lo junto aos credores. Só à União, a empresa deve mais de R$ 2 bilhões.

A recuperação judicial blinda a empresa dos pedidos de falência e permite uma trégua de seis meses no pagamento de dívidas passadas. Bens penhorados e créditos que a empresa possui e que estão depositados em juízo também ficam liberados. De acordo com a comissão de intervenção, a empresa tem em juízo um depósito de R$ 12 milhões referente a um processo de pedido de falência pela General Electric. "Isso sem contar os créditos a receber do governo (referentes a perdas provocadas por planos econômicos passados)", afirma o assessor jurídico Pedro Morel, que assinou ontem a petição. A expectativa, segundo Morel, é investir esses créditos na empresa para que ela volte a operar com carga e venha a prestar serviços de manutenção. "A empresa tem credibilidade, quem não tem é o (Wagner) Canhedo", disse, referindo-se ao controlador.

A Vasp está representada na ação pelos escritórios Esper Chacur Filho e Biolchi SC Advogados. Na petição inicial, os advogados pedem que o empresário Wagner Canhedo continue afastado da companhia. O texto pede ainda a prisão de Canhedo caso a apuração das denúncias de furto de bens e dilapidação do patrimônio da Vasp apontem o seu envolvimento. "Há indícios fortes de desvios de bens por parte dos Canhedo", afirmou o advogado Luiz Gonzaga Proença Junior, do escritório Esper Chacur Filho. Há duas semanas, uma turbina e outros equipamentos aeronáuticos foram encontrados escondidos numa concessionária de caminhões em São Bernardo do Campo. O dono da concessionária foi preso em flagrante.

A Vasp não voa desde janeiro e está sob intervenção da Justiça do Trabalho desde março, quando Canhedo foi afastado da gestão e seus bens ficaram indisponíveis. No mês passado, a Justiça determinou ainda a penhora dos bens do grupo econômico Canhedo, no valor de R$ 75 milhões, para pagar dívidas trabalhistas. De acordo com Biolchi, no processo de recuperação judicial os créditos trabalhistas terão de obedecer as regras da lei. A intervenção trabalhista, de outro lado, tinha a função exclusiva de pagar os trabalhadores. Caso o pedido seja deferido, a empresa terá 12 meses para pagar os créditos trabalhistas, avaliados em R$ 400 milhões. "Vai ser preciso fazer um acordo, paga-se o que for possível e o resto da dívida pode ser transformado em participação dos funcionários na empresa", disse o deputado.

Canhedo continuaria sócio, mas com o aumento de capital decorrente dos créditos trabalhistas e outros, sua participação ficaria bastante reduzida.

BOATOS

Segundo Biolchi, a falta de documentação financeira confiável - o balanço de 2004 não foi publicado - não deverá ser um empecilho para o juiz deferir o pedido. "Existe uma questão social em jogo", afirmou. Esta é a primeira ação de recuperação que ele defende.

A Vasp é a segunda companhia aérea a se beneficiar da Nova Lei de Falências, que entrou em vigor em 9 de junho. No dia 17, a Varig também entrou com pedido de recuperação judicial.

A opção pela recuperação judicial foi mantida sob sigilo até o último momento. Como ainda há funcionários que defendem Canhedo dentro da empresa, temia-se pelo vazamento da informação. Durante a assembléia, circulou o boato de que Canhedo estaria também entrando com pedido de recuperação judicial. Isso acelerou os trabalhos dos advogados, que ajuizaram a ação às 11h30.

Fontes ligadas ao empresário afirmam que nos últimos dias ele andou de fato consultando advogados a esse respeito.