Título: Bastos pede trégua e FHC sai de cena
Autor: Vera Rosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/07/2005, Nacional, p. A6

Um enviado do governo conseguiu sensibilizar parte importante da oposição para a delicadeza do momento político e a necessidade de uma trégua temporária que dê tempo às apurações das denúncias e ajude a prevenir uma crise institucional. O emissário foi o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, e seu interlocutor, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. A amigos, o ex-presidente disse que viaja para o exterior amanhã com o objetivo de "submergir". O ex-presidente repetiu a Thomaz Bastos o que tem dito desde o início da crise: não vai contribuir para pôr mais lenha na fogueira, mas não abrirá mão de criticar erros da gestão petista, cumprindo seu papel de oposição. O ministro, que se diz amigo de FHC "há muito tempo", falou na preservação das instituições. Mais: relatou que o presidente Lula, em troca da compreensão dos oposicionistas, se dispunha a definir uma agenda de projetos que atendessem a interesses dos dois lados. FHC até se dispôs a ir a Brasília para uma conversa com o presidente Lula, exigindo apenas que houvesse um convite público antes.

Ao final da conversa, FHC não conseguiu evitar o conselho. "O que o presidente Lula precisa fazer é governar", afirmou, apenas alguns dias antes de recomendar a Lula que desista já da reeleição em 2006, para ganhar condições de árbitro da crise. O conselho passou, mas a nova intervenção foi a gota d água para acirrar mais os ânimos.

Lula ficou furioso. "Se Fernando Henrique pensa que vai me intimidar, está muito enganado", rebateu o presidente. "Ninguém vai dizer o que eu devo ou não fazer aqui, até porque ninguém tem mais interesse do que eu em apurar todas essas denúncias. E se alguém está pensando em eleição é ele, não eu."

Numa outra frente de aproximação com os tucanos, Palocci recorreu aos senadores Tasso Jereissati (CE) e Arthur Virgílio (AM) e chegou a levar ao Planalto o governador de Minas, Aécio Neves. Tasso disse que não adianta Lula falar em "mão estendida" no discurso, mas, na prática, incentivar o confronto. Conhecido por seu estilo mordaz, Virgílio foi mais incisivo no bombardeio: "O governo só age em função de 2006. Nem quando tentamos ajudar, o PT pára de bater na gente", reclamou o líder do PSDB no Senado.

Virgílio fez mais reclamações: "Estender a mão e depois morder não dá. O presidente Lula precisa ver se quer preservar sua história, sobreviver ou morrer politicamente. Só ele tem a caneta para nomear e demitir", acrescentou. Virgílio também opinou que o senador José Sarney (AP), da ala governista do PMDB, poderia e deveria contribuir mais para distender o ambiente. "Sarney poderia ser mais atuante, pôr mais a mão na massa", disse o tucano a seu interlocutor governista.

SESSÃO ESPÍRITA

Os tucanos estão irritados com a tentativa dos petistas de ampliar o leque de investigação na CPI proposta para investigar o mensalão. Para dar o troco, o Planalto quer retroagir no tempo e apurar se houve compra de votos, em 1997, para garantir a reeleição de FHC em 1998.

"Será que querem fazer uma sessão espírita e ressuscitar o Sérgio Motta?", ironizou Virgílio, ao mencionar o ex-ministro das Comunicações, morto em 1998 e acusado pelo PT de ter sido o operador do esquema. "Ou será que vão querer agora o impeachment do Fernando Henrique?"

Thomaz Bastos também procurou o prefeito de São Paulo, José Serra (PSDB), e o senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA). Todos mostraram disposição para o diálogo, mas alegaram não haver uma pauta concreta. Seguem o mesmo figurino adotado pelo PT na oposição. "O Planalto está sem comando político, desarticulado e despreparado para enfrentar os pipocos que acontecem. É um governo desnorteado", resumiu o líder do PFL no Senado, José Agripino (PFL).

Para o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), a oposição não perde por esperar e terá surpresas na reforma ministerial, que, segundo seu diagnóstico, representará "um novo ciclo", com uma "faxina completa" nas diretorias de estatais importantes, como Correios, Furnas, Instituto de Resseguros do Brasil (IRB), Petrobrás e Infraero.