Título: Sucesso: sonda bate no cometa
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Fonte: O Estado de São Paulo, 05/07/2005, Vida&, p. A16

PASADENA, EUA - A missão suicida de uma pequena sonda espacial americana foi concluída com sucesso extraordinário ontem, quando ela se chocou com um cometa do tamanho de uma pequena cidade, 134 milhões de quilômetros além da órbita da Terra. A colisão, monitorada minuciosamente por uma série de observatórios em terra e no espaço, produziu um flash de luz incandescente e uma explosão de vapor e poeira do cometa. Informações que, uma vez analisadas, poderão dar pistas importantes sobre a formação do sistema solar e sobre a origem da vida na Terra, segundo os cientistas. O impacto com o cometa Tempel 1 ocorreu exatamente às 2h52 de ontem (horário de Brasília). A espaçonave camicase, do tamanho de uma pequena lava-louças, foi pulverizada na colisão, a uma velocidade de 37 mil quilômetros por hora. Antes disso, entretanto, coletou e enviou uma série de imagens e informações sobre o cometa, que poderão ser estudadas pelos pesquisadores em terra. Foi a primeira vez que uma espaçonave fez contato com um cometa. O encontro foi monitorado de perto pela sonda espacial Deep Impact - a nave-mãe da missão da Nasa, que carregou a sonda impactadora por 172 dias e 431 milhões de quilômetros no espaço antes de lançá-la contra o Tempel 1.

A explosão do impacto, segundo a Nasa, foi equivalente a quase 5 toneladas de TNT. Observatórios relataram um aumento de cinco vezes do brilho do cometa - suficiente para ser visto a olho nu da Terra. Ontem, os cientistas ainda não sabiam precisar o tamanho da cratera formada pelo impacto, mas disseram que o buraco poderia variar do tamanho de uma casa até um estádio de futebol, dependendo da composição do cometa. A colisão levantou uma nuvem de gás, gelo e poeira, que encobriu uma das extremidades do Tempel 1 e até o fim da tarde de ontem ainda impedia a observação da zona de impacto.

Mas só ter acertado o cometa já foi motivo de grande comemoração na comunidade científica. "A imagem claramente mostra um impacto espetacular", disse o pesquisador-chefe da missão Deep Impact, Michael A'Hearn, da Universidade de Maryland. "Sabemos que criamos uma grande cratera. Acreditamos que a sonda tenha penetrado profundamente no cometa, portanto sabemos que teremos uma boa idéia do seu interior", disse o gerente do projeto, Rick Grammier. "Temos uma enorme riqueza de informações científicas para analisar nos próximos meses."

A última imagem enviada pela sonda impactadora foi tirada a 30 quilômetros da superfície do cometa. "Dizem que uma foto vale por mil palavras", disse Grammier, do Laboratório de Propulsão a Jato (JPL) da Nasa. "Mas quando você olha para algumas das imagens que captamos nas primeiras hora do 4 de julho de 2005, acho que podemos escrever uma enciclopédia inteira."

O Tempel 1, assim como os outros cometas, foi formado aproximadamente 4,6 bilhões de anos atrás, a partir dos mesmos materiais que deram origem ao Sol e aos planetas do sistema solar. Isolado na periferia do sistema, entretanto, permaneceu congelado e inalterado por quase todo este tempo, até ser lançado para o interior do sistema e começar a ser derretido pelo calor do Sol. Por isso estudar a composição de um cometa é como pesquisar um fóssil espacial. Além disso, vários cientistas especulam que a vida pode ter sido "semeada" na Terra por cometas, que teriam trazido água e outras moléculas orgânicas para o planeta cerca de 3,9 bilhões de anos atrás, quando as primeiras formas de vida começavam a surgir.

Análises do material ejetado pela colisão e da cratera permitirão aos cientistas estudar a composição e a densidade dos cometas. O Tempel 1 tem 14 quilômetros de comprimento por 4,6 de largura - metade da ilha de Manhattan, em Nova York. A sonda impactadora, por outro lado, media apenas 1 por 1 metro. A sonda espacial Deep Impact permanecerá observando o cometa até 3 de agosto, quando será encerrada a missão.