Título: Apesar da ajuda, África piorou
Autor: João Caminoto
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/07/2005, Internacional, p. A14

Deve ter parecido uma idéia maravilhosa no fim dos anos 70: construir uma moderna fábrica de tapetes em Ihiala, no sudeste da Nigéria, dando um pequeno empurrão na esperada transformação daquele país pobre e atrasado num tigre econômico africano. O Estado de Anambra tomou um empréstimo de US$ 17 milhões de um banco ocidental e escolheu um pedaço de terra virgem. Mas nem uma única pá de terra chegou a ser retirada. Mais de 25 anos depois, o empréstimo ainda está sendo pago. Como a terra intocada, a Nigéria e grande parte da África não foram transformadas pela ajuda despejada por doadores nas últimas décadas, da qual a maior parte foi roubada ou desperdiçada. Apesar dos bilhões de dólares em doações e empréstimos, a África é o único continente que anda para trás: está pior do que há 25 anos.

Agora, uma combinação de política, boa vontade e coordenação está dando à África o maior alívio em anos em dívida e ajuda. Os ministros das Finanças dos países mais ricos concordaram no mês passado em perdoar US$ 40 bilhões em dívidas, numa tentativa de tirar da pobreza 18 dos países mais pobres. Destes, 14 são africanos.

A reunião do Grupo dos 8 que começa hoje em Gleneagles, Escócia, concluirá o acordo da dívida e poderá ir mais além. Se o lobby britânico tiver sucesso, o G-8 poderá dobrar a ajuda externa total à África. O esforço é tão vasto que ninguém pode dizer se ele fará milagres ou repetirá erros do passado, quando a ajuda fomentou a dependência, não o progresso.

"Não sabemos. Realmente não há um precedente para isso", afirmou Todd Moss, analista do Centro de Desenvolvimento Global, com sede em Washington. Os países que mais tiveram sucesso na redução da pobreza, China e Índia, fizeram isso com pouca ajuda, observou ele. "Não creio que a ajuda leve ao crescimento econômico sustentado na África sem grandes mudanças dentro de alguns desses países."

Em alguns países africanos, como a Nigéria, infestada pela corrupção, as pessoas concordam que o alívio da dívida raramente chega aos que mais precisam. "O homem comum não se beneficia de nenhum perdão de dívida por parte de credores estrangeiros. Isso é aproveitado pelo governo", afirmou Ernest Emefieh, de 60 anos, que administra um cibercafé em Festac Town, um subúrbio de Lagos. "Não apóio nenhum alívio de dívida, pois não iremos aproveitá-lo."

Mas muitos economistas e ativistas contra a pobreza respondem que aliviar o peso da dívida é a única maneira de reduzir a miséria nas nações mais pobres. O Banco Mundial começa a preferir doações a empréstimos para os países mais necessitados, para evitar que eles afundem em dívidas futuras.

O histórico de responsabilidade de quem recebe a ajuda é essencial. Os 18 países qualificados para o plano de alívio do G-8 promoveram reformas para combater a pobreza e a corrupção, e o perdão da dívida deve se traduzir em educação gratuita e novas escolas e clínicas para cerca de 120 milhões de pessoas. Outros 22 países poderão se qualificar no futuro, com o perdão da dívida alcançando potencialmente US$ 55 bilhões.