Título: Karina liga Valério a Mentor e ao Banestado
Autor: João Domingos e Eugênia Lopes
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/07/2005, Nacional, p. A5

A secretária Fernanda Karina Somaggio, ex-funcionária do publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza, prestou depoimento ontem na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Correios. Ela reafirmou as denúncias contra o ex-patrão e trouxe algumas novidades. Revelou, por exemplo, detalhes do relacionamento de seu ex-patrão com o deputado José Mentor (PT-SP). Ao longo do ano passado, Mentor foi relator da CPI do Banestado, que investigou remessas ilegais de dinheiro para o exterior. De acordo com Karina, o empresário acompanhou de perto perto a investigação parlamentar e teve vários encontros com Mentor em Brasília. Duas das empresas de Valério, as agências de publicidade DNA e SMPB, fizeram remessas suspeitas identificadas pela CPI do Banestado.

Anteontem, ao depor na CPI dos Correios, o empresário disse que tinha conversado com Mentor sobre campanhas eleitorais em Americana (SP), Casa Branca (SP) e Marília (SP).

Karina contou uma história diferente. "Uma vez, quando Mentor telefonou com uma notícia sobre a CPI do Banestado, o sr. Marcos Valério mandou que eu pegasse as 25 pastas suspensas em que ele guardava notas fiscais e de investimentos e picotasse tudo", narrou. "Foram feitos quatro sacos de papel picado. O Marcos Valério só saiu da minha frente quando eu tinha picado tudo."

PISTAS

A ex-secretária deu também novas pistas para investigar as atividades financeiras do ex-patrão. Contou, por exemplo, que telefonou para um doleiro de Belo Horizonte a pedido dele. "Fiz a ligação na época em que ele importou três cavalos, pagos em dólar". Karina ofereceu ainda o endereço do doleiro, segundo ela, chamado Haroldo: Avenida do Contorno, 5.517, 6.º andar. Mas não soube dizer se Valério tem conta no exterior.

O senador Álvaro Dias (PSDB-PR), que fazia as indagações, afirmou que a DNA Propaganda, uma das empresas mais prósperas de Marcos Valério, com faturamento anual de R$ 200 milhões, é suspeita de ter enviado U$ 1 milhão para bancos no estrangeiro até 2002, por intermédio de doleiros ou da conta Beacon Hill, uma das lavadoras de dinheiro detectadas durante a apuração da CPI do Banestado. Esses documentos, segundo Dias, estão com o Ministério Público Federal do Paraná. Na CPI, acrescentou o senador, há um papel que comprova operação de U$ 220 mil, feita pela DNA.

Fernanda Karina voltou a se referir às altas somas em dinheiro retiradas das contas da DNA e da SMPB, empresas de Marcos Valério. Disse que, quando o ex-patrão transportava dinheiro, nunca usava avião de carreira, mas pegava carona em jatinhos do Banco Rural ou de amigos.

Reafirmou que no mesmo dia de uma viagem da secretária Simone Vasconcelos a Brasília houve retiradas muito altas das contas de Valério. Ela tornou a dizer que não via o dinheiro, mas ouvia as pessoas falarem sobre as quantias. E, nos dias em que haveria a retirada, os motoboys chegavam muito cedo, o que leva a crer que eram atendidos fora do horário bancário.

Disse ainda que ligava sempre para Marcus Flora, secretário-executivo da Secretaria da Comunicação de Governo (Secom), para falar com Marcos Valério. Reafirmou as ligações constantes que eram feitas para Delúbio Soares, tesoureiro que se licenciou do PT na terça-feira. No depoimento feito na quarta-feira, o empresário se disse amigo pessoal de Delúbio.

A ex-secretária reafirmou também ter ligado várias vezes para Sílvio Pereira, que na segunda-feira deixou a secretaria-geral do PT. Valério disse que se encontrava com Sílvio para tratar de campanhas políticas.

Ela disse que Marcos Valério é um homem frio. "Diria que chega a ser arrogante. Tanto é que os funcionários da área de produção da empresa nem falavam com ele. Na empresa, ele gostava que as pessoas tivessem medo dele", contou. Repetiu que, um dia antes do anúncio do resultado da licitação para a campanha publicitária dos Correios, ele encomendou salgadinhos e champanhe para comemorar a vitória.

Antes de começar a depor, Karina leu, para os integrantes da CPI, um texto que ocupava várias folhas de papel. "Eu e minha família vivemos com medo, ameaçados e verdadeiramente assustados. Porém, acho que valeu a pena, em razão da criação da CPI, que está investigando todos os fatos que já eram do meu conhecimento."