Título: Menor de 12: alvo preferencial
Autor: Luciana Garbin
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/07/2005, Metrópole, p. C1,4,5

Traficantes aliciam garotos na porta do projeto Criança Cidadã

Com menos de 12 anos uma criança não pode ir para a Febem. Se cometer um ato infracional, receberá do juiz uma medida de proteção, como, por exemplo, ser levada a um abrigo, caso a família não seja localizada ou não tenha condição de cuidar dela. No centro da cidade, o Programa Criança Cidadã atende crianças e adolescentes de zero a 17 anos em situação de rua, vindas das zonas norte, oeste e do centro - em junho foram 421. Em média, 70% usam drogas. Parte é aliciada pelo tráfico, que vê nas crianças o atrativo de despertar menos atenção da polícia e não correr risco de internação na Febem.

Pela lei, o portão do Criança Cidadã - programa mantido pelo Centro de Assistência e Promoção Social Nosso Lar, em parceria com o Estado - fica sempre aberto. As crianças podem entrar e sair quantas vezes quiserem. Isso acaba sendo uma arma na mão de traficantes. "Não damos informações no portão, eles não podem entrar, mas a gente sempre percebe uma movimentação. Eles sabem os horários da casa melhor do que eu e alguns ficam na grade para serem vistos, às vezes chamam pela criança", explica Roma Pitombo Di Monaco, diretora do Criança Cidadã e integrante do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente (Condeca). "O menor de 12 anos é usado porque a lei o protege de punição maior. Os menorzinhos chegam a passar pelo vão das grades do portão."

Abrigo provisório, onde as crianças deveriam passar apenas 48 horas, mas chegam a ficar meses a fio se não fugirem, o Criança Cidadã recebe meninos e meninas encaminhados por policiais, guardas-civis e projetos sociais da Prefeitura. Ou por ordens de abrigamento expedidas por fóruns e conselhos tutelares. Lá, tomam banho, ganham roupa, comida, participam de oficinas, conversam com educadores.

São, segundo Roma, filhos de uma realidade complexa, que envolve mães muito jovens, falhas na educação, desestrutura familiar, apelo de consumo, drogas e outros problemas. Para ela, só mudar o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e exigir que crianças de menos de 12 anos também possam ficar numa mini-Febem não ajudaria. "Não é prendendo que resolve. É fazendo política pública com família, municipalizando atendimento, integrando ações de assistência, saúde, educação, habitação."

"Não acho na lei medida onde a criança seja obrigada a ficar no abrigo. E temos de achar uma alternativa pois os abrigos estão lotados e vários sendo fechados pelo poder público", diz o juiz titular da Vara Central da Infância e da Juventude, Adalberto José Queiroz Telles de Camargo Aranha Filho.