Título: Dez países, dramas semelhantes
Autor: Luciana Garbin
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/07/2005, Metrópole, p. C1,4,5

Estudo mostra similaridades no recrutamento de jovens por bandidos, como a iniciação gradual no crime ainda na infância

Após observar grupos armados de crianças e adolescentes da Colômbia, El Salvador, Equador, Jamaica, Nigéria, Irlanda do Norte, Estados Unidos, Filipinas, África do Sul e Brasil (Rio), pesquisadores da ONG Crianças e Jovens em Violência Armada Organizada (Coav) encontraram várias semelhanças. A idade média de entrada nos grupos, 13 anos e 6 meses, se repete, assim como a maneira gradual como se adere ao crime - no caso brasileiro, ao tráfico -, ainda na infância. "Eles vêem isso como coisa do dia-a-dia. O tráfico não precisa recrutar. Já tem um monte esperando para entrar", diz o pesquisador inglês Luke Dowdney, que vive no Brasil. Ele participou do estudo Nem Guerra Nem Paz, do Coav, que analisa a situação dos dez países, e deve lançá-lo em agosto, em Brasília.

Segundo Dowdney, o tráfico é uma maneira de crianças e adolescentes responderem a fatores de risco de seu cotidiano, como a pobreza, a falta de alternativas realçada por baixa formação educacional e alto nível de desemprego, o preconceito, o racismo e a baixa auto-estima, a violência de agentes do Estado (polícia) e grupos rivais, os problemas em casa e com a família e a falta de lazer. À pobreza, por exemplo, respondem com boa remuneração; à falta de alternativas, com ascensão social; ao preconceito e baixa auto-estima, com reconhecimento social, poder e acesso a armas, símbolos de status; à falta de lazer, com drogas e adrenalina. E assim por diante.

"Cada um de nós responde de maneiras diferentes aos riscos sociais", diz Dowdney. "Alguém que consegue um bom emprego com o amigo de um amigo ou status jogando num time de futebol vai ter menos chance de cair no tráfico. A maioria é resistente a ele. Apenas entram os que não têm opção nem receberam outras influências."

Para o pesquisador, é preciso ter isso claro para poder criar resistências são fundamentais projetos de prevenção que ofereçam alternativas e boas influências. "A sociedade é que está mal, a criança apenas responde a fatores de risco. As cidades pesquisadas têm áreas de pobreza e exclusão. Se elas não existissem, esse grupos não existiriam."

As conclusões reforçam o que especialistas vêm dizendo há tempos sobre o tráfico: não é só pelo dinheiro fácil que crianças sucumbem. Relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT) revela que até 1995 poucos traficantes do Rio empregavam crianças. Temiam a rejeição de moradores das favelas. Hoje isso mudou. E, para ser combatido, pede ações integradas e de prevenção. "As políticas preventivas têm um custo infinitamente menor que as de repressão", diz o representante da Unesco Jorge Werthein. "O Brasil ainda não conseguiu desenvolver políticas de inclusão eficientes. Não existe nada mais eficiente que criança na escola. Uma que forme, ensine e dê prazer."