Título: 16 milhões de registros na mira do INSS
Autor: Vânia Cristino,Lu Aiko Otta
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/07/2005, Economia & Negócios, p. B3

Cruzamento de cadastros de contribuintes da Previdência e da Receita dá pistas para identificar benefícios irregulares

BRASÍLIA - A Previdência Social é o centro do "choque de gestão" que o governo está preparando porque o pagamento de aposentadorias e pensões é o maior item de despesas da União, consumindo R$ 140 bilhões por ano, mas é feito com base num cadastro totalmente falho. Depois de cruzar o cadastro de pessoas que contribuem ou que recebem benefício do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e da Receita Federal, o governo encontrou 16 milhões de registros que não conferem. São casos de um mesmo CPF com dois nomes diferentes, ou pessoas com nome igual, nome da mãe igual e CPF diferente. Também foram encontradas 9.500 pessoas na lista de beneficiários do INSS que constam como mortas em outro cadastro. Há, ainda, 600 mil pessoas que contribuem para o INSS e ao mesmo tempo recebem aposentadoria ou pensão. "Nosso cadastro é falho, não dispõe de informações confiáveis e, sem isso, não podemos partir para o corte ou suspensão do pagamento de benefícios possivelmente irregulares", reconheceu o ministro da Previdência Social, Romero Jucá, em entrevista concedida ao Estado no apagar das luzes de sua gestão. Ele entregou o cargo ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva na sexta-feira.

Para o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, organizar o Ministério da Previdência é o "ponto nevrálgico" do "choque de gestão". "Esse é o coração do negócio, é algo absolutamente vital.". Ele destacou que, entre arrecadação e pagamento de benefícios, a pasta movimenta R$ 240 bilhões. "É muito dinheiro, são quase US$ 100 bilhões", disse. "Não tem nada que possamos fazer para melhorar a gestão sem começar por ela." Em meio ao reconhecimento de que a Previdência precisa urgentemente ser organizada, ressurgiu na semana passada a idéia de fusão da Receita Federal com a parte do Ministério da Previdência encarregada da arrecadação, criando a Receita Federal do Brasil. O projeto já foi anunciado algumas vezes pelo governo, mas nunca chegou a ser implantado por causa de resistências das corporações da Receita e do INSS. O ex-ministro da Previdência Amir Lando estava próximo de iniciar a execução do projeto, mas a entrada de Romero Jucá brecou os preparativos, segundo informou um técnico.

MURRO NA MESA

Agora, o novo ministro da Previdência já assumirá a pasta orientado a cooperar com a Fazenda na implementação desse projeto. A fusão significará um emagrecimento da pasta da Previdência e a transferência de parte de sua estrutura para a Fazenda. É também por essa razão que a tendência, no fim da semana, era de que o futuro ministro da Previdência seria um técnico, e não um político.

Segundo Bernardo, a fusão das duas estruturas permitirá economia de recursos públicos. "Vamos reduzir custos operacionais, simplificar processos e integrar os sistemas de atendimento ao contribuinte", comentou. O ministro disse que a fusão será feita gradualmente.

Nenhuma das medidas em discussão ou em andamento, porém, trará efeitos imediatos sobre a Previdência. "Não tem murro na mesa que resolva o problema", afirmou um técnico. "Esses são problemas que se resolvem na construção tijolo por tijolo, e não com choque." Há um conjunto de medidas em andamento na Previdência, em três frentes: melhorar o atendimento, fazer uma atualização tecnológica e, finalmente, melhorar a arrecadação com combate a fraudes e aperfeiçoamento dos sistemas de cobrança.

Uma medida já em andamento é a ampliação do número de postos de atendimento, de 1.160 agências para mais de 20 mil. É que vão ser montados quiosques nas 10 mil agências do Banco Popular do Brasil, 6 mil agências dos correios, sindicatos e associações de classe. "O novo modelo vai reduzir as filas em 90%", disse Jucá.

Com o novo modelo de atendimento virá a modernização tecnológica, que permitirá à Previdência Social monitorar e rastrear todas as informações colocadas no seu cadastro, evitando fraudes. Dentro de poucos meses será possível rastrear as senhas e, no ano que vem, todo o acesso ao cadastro só será feito com a identificação digital do servidor. A Previdência acredita que com isso estará construindo uma verdadeira blindagem contra a fraude que é praticada internamente, com a participação de servidores.

Para garantir o aumento da arrecadação, a Previdência já está monitorando, em cada Estado, 70% dos maiores contribuintes. O recolhimento mensal é acompanhado mês a mês e qualquer desvio aciona a visita imediata de um fiscal.

Para combater as fraudes no pagamento de benefícios, a Previdência vai fazer, por meio de convênio com a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), o recadastramento de todos os 23 milhões de segurados. O recadastramento vai ser feito ao longo de oito meses, nos próprios bancos onde os segurados recebem a aposentadoria e pensão. Eles serão chamados, aos poucos, para trocar o cartão bancário e aí preencherão os dados que faltam. O alvo principal do recadastramento são os 8 milhões de beneficiários com data de início do benefício anterior a 1994 e mais 1 milhão que recebem por terceiros, por meio de procuração.