Título: Prisão de petista com mala de dinheiro tira Genoino do comando do partido
Autor: Vera Rosa Ana Paula Scinocca
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/07/2005, Nacional, p. A4

Na despedida, ele diz que assume a responsabilidade por erros, mas não por corrupção; Tarso Genro é o novo presidente do PT

O presidente do PT, José Genoino, caiu. Emocionado, ele entregou ontem o cargo, logo no início da reunião do Diretório Nacional, em São Paulo. Sua permanência à frente do partido ficou insustentável depois da avalanche de denúncias que culminaram na crise do mensalão, provocada pelas acusações do deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ). O novo presidente do PT será o ministro da Educação, Tarso Genro, que deixará o governo, comandando um "gabinete de crise" no partido. Genoino é o terceiro dirigente do PT que sai, em menos de uma semana, no terremoto que também derrubou o secretário-geral, Silvio Pereira, e o tesoureiro, Delúbio Soares. No discurso de despedida a portas fechadas, o presidente do PT arrancou lágrimas dos companheiros ao dizer que deixava o comando do partido porque não queria ser motivo de divisão interna. "Assumo a responsabilidade por erros e equívocos. Jamais por crime, irregularidades e corrupção", disse.

Logo depois, jurou não ter nenhuma ligação com o escândalo do transporte de dinheiro que culminou com a prisão de José Adalberto Vieira da Silva, secretário de Organização do PT cearense e assessor do deputado estadual José Nobre Guimarães (CE), seu irmão.

Abatido, Genoino insinuou que o Campo Majoritário - grupo moderado do PT, que detém 60% dos cargos de direção da legenda - não lhe deu apoio e o abandonou na hora mais difícil de sua vida. Depois, comparou sua queda ao momento de sua prisão, em 1972, quando era guerrilheiro no Araguaia. "Naquela época, fiquei apartado dos meus companheiros. É o que estou sentindo hoje."

UMA SÓ CAMISA

No desabafo, Genoino foi taxativo ao defender a unidade do PT. "O projeto que me move não é o do Campo Majoritário, mas do PT. Quando entrei no PT, tinha duas camisas", afirmou, numa referência ao tempo em que era radical do clandestino PRC e se abrigou no partido criado pelo então sindicalista Luiz Inácio Lula da Silva. "Agora, saio só com uma: a do PT."

Muito aplaudido, ele disse ainda que, se a crise não for enfrentada, poderá produzir a "interdição" da alternativa de esquerda nos próximos anos. "É preciso ter cuidado, porque, do contrário, a cada pancada será cedido um pedaço", afirmou.

Antes de sair, Genoino fez uma autocrítica dos 30 meses em que presidiu o PT. "Talvez não tenha percebido os problemas de ser partido do governo", admitiu. "Muitas vezes fomos atropelados por fatos dos quais não tínhamos controle."

ACERTO

O acerto para a saída de Genoino foi feito por integrantes do Campo Majoritário em conjunto com Lula, ainda na noite de sexta-feira, depois que Silva foi detido, no Aeroporto de Congonhas, com uma mala recheada de R$ 200 mil, além de US$ 100 mil na cueca. "Meu Deus do céu!", exclamou Lula, segundo um ministro, ao saber do episódio. Parecia incrédulo. "Infelizmente, não temos mais como segurar o Genoino", completou, ao avaliar que aquela imagem era mais forte que mil palavras.

Na manhã de ontem, Lula e Genoino conversaram por telefone. O presidente disse ao antigo companheiro que mantinha a confiança nele, mas que a situação ficara insustentável. Lula agradeceu o empenho de Genoino para tentar unir o PT desde dezembro de 2002, quando assumiu o cargo.

Na prática, toda a estratégia traçada pelo Campo Majoritário teve de ser alterada de madrugada. Antes da prisão de Silva, a cúpula do PT, em sintonia com o Planalto, articulava-se para manter Genoino. Nem a descoberta, no fim de semana, de que o publicitário Marcos Valério fora avalista de um segundo empréstimo para o PT, em 2003, teve efeito tão devastador.

Genoino resistiu o quanto pôde. Mas foi convencido a renunciar. "Hoje é um dia muito triste para nós", resumiu o líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP). "Genoino é uma pessoa da nossa inteira confiança, só que nessa hora precisamos ter frieza política. O presidente do PT não pode pagar pelo que não deve, mas a imagem do partido é mais importante nessa hora."

Depois do discurso de Genoino, houve silêncio um na sala de reunião. "Foi o silêncio mais ruidoso da história do PT", definiu o deputado Chico Alencar (RJ). Em seguida, o já ex-presidente do PT também chorou.

'CANALHA'

O clima de tensão invadiu o ambiente. Valdemir Garreta, ex-secretário de Comunicação da prefeita Marta Suplicy, não conteve a indignação. "Vocês nos traíram", gritou ele para o prefeito de Guarulhos, Elói Pietá, um dos que defenderam o afastamento de Genoino, juntamente com o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (SP). "Ganhei limpo duas eleições em Guarulhos e vocês perderam uma sujos", respondeu o prefeito. A discussão não parou aí. "Canalha!", berrou Garreta.