Título: CPI foge ao controle do governo e passa a investigar tudo
Autor: João Domingos
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/07/2005, Nacional, p. A11

Contra vontade do Planalto, comissão agora investiga desde operações financeiras até atividades de ex-arapongas

BRASÍLIA - O governo perdeu a batalha para controlar a CPI dos Correios. Com menos de 20 dias de existência, ela é diferente de outras de grande repercussão criadas no passado, como a do esquema PC Farias, que resultou no impeachment do presidente Fernando Collor. A atual, criada formalmente para "verificar as causas e conseqüências de denúncias e atos delituosos praticados por agentes públicos nos Correios" investiga tudo e não apenas o fato que motivou a sua criação. Quem assistir a uma sessão da CPI dos Correios poderá sair da apertada sala onde senadores e deputados do governo e da oposição se digladiam com a impressão de que ali foi instalado um grande tribunal de investigação. Apuram-se as operações financeiras da direção do PT; as ligações do presidente do PSDB, senador Eduardo Azeredo (MG), com o empresário Marcos Valério Fernandes de Souza; o pagamento de mesadas a deputados - o mensalão -; a atuação dos arapongas da Agência Brasileira de Inteligência (Abin); o enriquecimento ilícito de servidores e até irregularidades praticadas nos Correios. A toda hora alguém apresenta um requerimento que atinge algum dirigente do governo ou da oposição, em assuntos que nada têm a ver com os Correios. "Não há mais recuo", diz o deputado Pompeu de Mattos (PDT-RS), um dos que mais instigam a base governista.

Dada sua importância - e a repercussão que provoca, com sessões de até 15 horas transmitidas ao vivo pela TV Senado -, a CPI fez com que os partidos escalassem alguns de seus principais quadros. Prevendo já embates jurídicos infindáveis, quase toda a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara migrou para a CPI. Os senadores também mandaram para a CPI seus quadros mais importantes. Juntos, esses parlamentares fazem um barulho infernal, brigam horas seguidas para aprovar ou rejeitar um requerimento, provocam uns aos outros e, às vezes, até se insultam.

Um discurso da senadora Ideli Salvati (PT-SC), por exemplo, provocou a seguinte reação. "A Ideli está falando? Deixa eu voltar lá para atrapalhá-la", disse o senador Heráclito Fortes (PFL-PI) já no final do depoimento da ex-secretária Fernanda Karina Somaggio, na quinta-feira, por volta das 21h30. Ele tinha decidido ir embora, mas Ideli pediu a palavra. Heráclito voltou, sentou-se de frente para a senadora e fez o que mais gosta: provocá-la.

Quando o clima esquenta, até parlamentares do mesmo partido se atacam. Os deputados pefelistas ACM Neto (BA) e Onyx Lorenzoni (RS), que não se importam de viver aos berros, costumam chamar a atenção um do outro quando estão falando. "O senhor me respeite" ou "desligue esse celular porque está me atrapalhando".

A bancada do PT tem parlamentares experientes nas guerras sindicais.

Mas na CPI, eles estão acuados. Adotaram por estratégia a tentativa de desmoralizar as pessoas que vão à CPI prestar depoimento que possa comprometer o governo; ou levantar a bola de quem pode ajudar. Assim, foram muito agressivos com Fernanda Karina e muito indulgentes com o empresário Marcos Valério. Com as oposições aconteceu exatamente o contrário: ficaram do lado de Fernanda e atacaram violentamente o publicitário.

Ideli, que tem por obsessão conseguir algum tipo de punição para o deputado Roberto Jefferson (RJ), faz exatamente o papel que foi de Jefferson na CPI de PC Farias. Na época, Jefferson ficou conhecido como um dos comandantes da tropa de choque do ex-presidente Fernando Collor. Ele procurava desmoralizar as pessoas que depunham. Ideli o repete.

E agora, as pessoas acompanham a sessão da CPI pela televisão e pela internet.