Título: Fórmula faz sucesso no interior
Autor: Mariângela Gallucci
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/07/2005, Metrópole, p. C4

RIO CLARO - Flávia, de 31 anos, quer a chance de não errar dada a Luísa, de 29, e igualar o sucesso de Carmem, de 34. Presa 15 dias depois de dar à luz, Flávia (os nomes citados são fictícios) não vê a filha de 9 anos crescer porque dirigia o carro usado na fuga de um sujeito que roubou e matou a vítima em seguida. Foi condenada a 20 dos 30 anos de pena máxima de latrocínio. A expectativa é de que Flávia seja, a partir desta semana, a 43ª presa a fazer parte do projeto pioneiro do Centro de Ressocialização (CR) Feminino de Rio Claro, em que condenadas por crimes hediondos passam o dia trabalhando fora da cadeia. Costureira, já tem emprego à sua espera. "Estou ansiosa para sair, mas tenho receio de me ver lá fora. Acho que vou me sentir meio desprotegida."

A progressão do regime fechado para o semi-aberto é proibida pelo Código Penal para autores de crimes hediondos. Mas, em Rio Claro, o impedimento trombou numa interpretação inovadora do juiz-corregedor, Júlio Osmany Barbin. Ele entendeu que as presas podem trabalhar fora, se a empresa buscá-las e levá-las na porta do CR. "Isso é diferente do semi-aberto, em que a presa fica solta de dia. Elas não circulam, saem só pra trabalhar", alegou.

"No começo, tínhamos que tentar mudar a cabeça dos comerciantes da cidade. Hoje, há fila de espera pelas meninas", afirma Irani Torres, diretora do CR e autora do projeto. Para as empresas, o negócio é vantajoso. As presas custam um salário mínimo mais seguro. Se estivessem em liberdade, teriam de ser contratadas pela CLT, com todos os encargos trabalhistas. Das 42 presas que já passaram pelo projeto desde 2002, 9 ainda cumprem pena. "Das 33 que ganharam a liberdade, nenhuma reincidiu e a maioria foi contratada pelas empresas", conta Irani.

As detentas sabem que precisam andar na linha, até para não prejudicar as outras. "O acordo com o juiz foi que, se uma errar, recolhemos todas", explica Irani.

O empresário Edson Vaz Domingues, patrão de Luísa e de outras detentas numa oficina de lingerie, não se arrepende. "É bom do ponto de vista dos encargos e é ótimo pela recolocação das pessoas. Elas se empenham muito." Na semana passada, uma de suas empregadas presas ganhou a liberdade e um convite para trabalhar lá com carteira assinada.

Carmem, condenada por tráfico, passou por todas essas fases e agora vive bem, com três empregos de faxineira. "Não acreditava nesse negócio de CR. Achava que com o tempo iria virar bagunça. Depois, vi que acreditavam na gente na prisão."