Título: Mineradora CFM diz ao Cade estar sendo asfixiada pela Vale
Autor: Irany Tereza
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/07/2005, Economia & Negócios, p. B12

Empresa reclama que seu acesso ao Porto de Sepetiba foi limitado, mas acusada diz que houve acordo

RIO - A Cia. de Fomento Mineral (CFM), do grupo Itaminas, uma das poucas mineradoras em atuação no Brasil fora do conglomerado Vale do Rio Doce, revelou ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) estar sofrendo limitações na exportação de minério desde que a Vale comprou a Ferteco e passou a controlar a Companhia Portuária da Baía de Sepetiba (CPBS), no Rio. A carta da empresa - a primeira mineradora a declarar abertamente estar sendo asfixiada pela Vale - foi anexada ao processo no qual é analisada concentração excessiva da Vale em mineração e logística, depois da compra de 4 mineradoras, de 2000 a 2002. Na semana passada, o Ministério Público Federal (MPF) emitiu parecer determinando restrições operacionais à Vale e citando a carta da CFM, dona de participação de 7,8% no mercado de granulados de ferro na região Sudeste em 2003. A quebra unilateral do contrato para embarque do minério, segundo o parecer, "sinaliza as dificuldades a serem enfrentadas pelas concorrentes da CVRD, situadas no território nacional, para se obter ganhos de escala".

A carta, à qual o Estado teve acesso, é assinada por um dos diretores da companhia, Gustavo Hulier. Ele diz que a CFM firmou, em 1999, com a CPBS, então controlada pela Ferteco, contrato de serviços portuários para exportação de 3 milhões de toneladas de minério de ferro por ano. A mineradora produz granulados que, por sua especificidade, não podem ser consumidos por siderúrgicas nacionais. Os principais clientes são os países asiáticos. Em 2001, quando a Vale adquiriu a Ferteco, limitou o trânsito das exportações pelo terminal a 1,5 milhão de toneladas, fixou a vigência do contrato a janeiro de 2008 e avisou que a renovação automática estava descartada.

"Nessas condições, os investimentos realizados se tornaram parcialmente ociosos, a situação econômica da empresa foi negativamente afetada e a manutenção das atividades depois da vigência do contrato seriamente ameaçada", diz o documento. A Vale nega que o contrato tenha sido rescindido unilateralmente. Em nota, a mineradora diz que "as empresas, de comum acordo, acertaram a assinatura de um novo contrato, em 7 de janeiro de 2002, baseado no histórico de performance das exportações da CFM". Segundo a mineradora, não houve exportações em 1999, 2000 e 2001. Em 2002 e 2003 o volume de vendas externas foi marginal e, em 2004, a maior participação, 1,5 milhão de toneladas.

Sobre o valor das tarifas, que a CFM diz terem sido duplicadas, a Vale diz que os novos valores "foram acordados entre as empresas no novo contrato", porque não cobriam os custos da CPBS. "Este é mais um caso de uma empresa que tenta se aproveitar do momento de análise pelos órgãos de defesa da concorrência das aquisições feitas pela CVRD para tentar renegociar um contrato que a própria CFM assinou", diz a nota.

A carta da CFM passou a fazer parte de um processo que já conta com pareceres da Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae), da Secretaria de Direito Econômico (SDE), e da procuradoria do Cade. O parecer do MPF foi o último antes da conclusão do relator do Cade, Ricardo Cueva. A expectativa é de que o relatório vá a plenário no próximo dia 27 ou, na pior hipótese, em 10 de agosto.

"Todos os pareceres colocaram restrições às compras da CVRD. A companhia agora tenta desqualificar esses instrumentos, mas todos têm um ponto em comum: a preocupação do sistema de defesa da concorrência com o grande poder da Vale junto ao mercado", diz Marco Polo de Mello Lopes, vice-presidente do Instituto Brasileiro de Siderurgia (IBS).