Título: Certeza na OMC: não há acordo
Autor: Jamil Chade
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/07/2005, Economia & Negócios, p. B6

A Organização Mundial do Comércio (OMC) concluiu ontem sua reunião ministerial com os 30 principais países do cenário econômico internacional, longe de um entendimento. Por enquanto, os países só concordaram que não será cumprido o prazo - final deste mês - para a elaboração de um primeiro rascunho de um acordo sobre a liberalização. Também concordaram em trabalhar mais para superar as diferenças e mantiveram 2006 como prazo final para completar a Rodada Doha. "A situação é difícil e não teremos em julho o entendimento que esperávamos obter", afirmou Clodoaldo Hugueney, embaixador brasileiro que representou o chanceler Celso Amorim no último dia das negociações na China. "Viemos esperando uma aproximação das posições, o que acabou não ocorrendo na proporção que esperávamos", disse Luis Felipe de Seixas Correa, embaixador do Brasil na OMC. A delegação australiana emitiu comunicado afirmando que a OMC fracassou em traduzir para a realidade as orientações dos chefes-de-estado que na semana passada participaram da reunião do G-8 na Escócia e pediram novos avanços nas negociações comerciais. "Estados Unidos e Europa não estão sendo flexíveis o suficiente", afirmou Mark Vaile, ministro do Comércio da Austrália.

Peter Mandelson, comissário de Comércio da Europa, disse que a reunião dos últimos dias não foi uma oportunidade perdida, mas acha que, se o atual ritmo das negociações for mantido, a conferência ministerial da OMC em Hong Kong em dezembro pode estar ameaçada. Até lá, os países precisam fechar um pacto sobre os rumos da liberalização comercial nos setores agrícolas e industriais. Supachai Panitchpakdi, diretor da OMC, afirma estar "muito preocupado". "Precisamos de decisões politicas pois não vejo muitas áreas de convergência."

Sem a possibilidade de cumprir os prazos, as conversas em Genebra vão na direção de uma estrutura de negociação, que funcionaria como uma primeira etapa para um acordo em outubro, em nova reunião entre os ministros na cidade suíça. Para Peter Allgeier, vice-representante de Comércio da Casa Branca, a questão será a de ver como os acontecimentos em Dalian se traduzirão em avanços nas próximas semanas.

A única real novidade nos últimos dias foi a apresentação da proposta sobre a redução de tarifas para produtos agrícolas do G-20, grupo de países emergentes coordenados pelo Brasil. O documento foi considerado como base de negociação por alguns países ricos, mas os europeus informaram ontem que vão responder com uma contra-proposta. Os americanos não indicaram como irão responder ao projeto, que prevê cortes nas tarifas para produtos agrícolas mais acentuados nos mercados mais ricos. Para a Oxfam, organização não governamental que acompanha o comércio mundial, americanos e europeus afirmaram aceitar a proposta do G-20 como base, mas deixaram espaço para manobrar seus interesses.

Ontem, no último dia de reuniões, os debates foram em parte dedicados a liberalização do setor industrial. O impasse, porém, foi mantido. De um lado, os ministros de economias ricas insistiram em maior abertura dos mercados emergentes. Enquanto isso, Brasil, Índia e Argentina não aceitam ceder em suas posições mais protecionistas. O Brasil criticou diretamente Japão e Suíça por tarifas que podem chegar a 3.000% para produtos agrícolas.

Ministros de países desenvolvidos, como o canadense Jim Peterson, ainda ficaram frustrados com o fato de que a aparente aceitação da proposta do G-20 como base de negociação não resultou em maior flexibilidade de mercados emergentes nos debates sobre a abertura dos setores de bens industriais. "Os países em desenvolvimento não podem ser obrigados a pagar por concessões aparentes na agricultura com movimentos recíprocos na área industrial", afirmou Celine Charveriat, especialista da Oxfam. O próprio Itamaraty coloca o ônus sobre os países desenvolvidos. "Para completar a rodada de negociações, o movimento precisa vir dos países ricos", afirmou Hugueney.