Título: Lavagna pode deixar governo de Kirchner
Autor: Ariel Palacios
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/07/2005, Economia & Negócios, p. B12

O Ministro da Economia, Roberto Lavagna, poderia deixar o governo do presidente Néstor Kirchner após as eleições parlamentares de outubro, segundo sustentam especulações no âmbito político e financeiro portenho. Os rumores sobre uma eventual saída de Lavagna do governo foram freqüentes desde meados de 2003, mas cresceram intensamente ao longo dos últimos dias e foram reforçadas ontem (quarta-feira) pelas críticas realizadas contra o ministro da Economia por parte de outros setores do gabinete Kirchner. Os analistas sustentam que Lavagna estaria preocupado pela briga política entre o presidente Néstor Kirchner e o ex-presidente Eduardo Duhalde. "El Pingüino" (O Pingüim) e "El Cabezón" (O Cabeção) como são conhecidos popularmente, mantiveram nos últimos dois anos uma aliança política que - apesar das tensões - conseguiu governar a Argentina. No entanto, esta aliança rompeu-se, e os dois homens mais poderosos do país estão em estado de guerra pela disputa do controle da província de Buenos Aires, feudo de Duhalde, onde concentra-se um terço do PIB argentino e 40% do eleitorado. O confronto está dividindo o Partido Justicialista (Peronista), complicando a governabilidade.

Lavagna, afirmam os analistas, conseguiu uma significativa imagem positiva entre os argentinos como o ministro da reativação econômica e o homem que conseguiu convencer os credores privados a aceitar uma drástica redução da dívida pública. Ele não pretende desperdiçar essa popularidade (é o ministro com melhor imagem do governo), e por esse motivo - segundo integrantes de seu entourage - o ministro (que possui aspirações presidenciais) não deseja permanecer em um gabinete que teria graves problemas para governar. O clima de confronto político já estaria "brecando" o crescimento da economia.

O jornal "La Nación" citando fontes próximas ao ministro afirmou que "ele tinha certeza de que haveria um acordo Kirchner-Duhalde, porque dessa forma o Peronismo chegou ao poder e pode governar com respaldo parlamentar. Mas, agora o cenário é outro".

Além dos potenciais problemas no futuro, Lavagna está em rota de colisão com setores do governo. Ontem, o Ministro do Interior, Aníbal Fernández, disparou contra Lavagna ao afirmar que "só o presidente toma as decisões finais" sobre a estratégia contra a inflação. Na véspera, o porta-voz de Lavagna, Armando Torres, havia anunciado que o Ministério "monitorará rigorosamente os acordos salariais" para evitar que estes continuem provocando alta da inflação.

O posto de Lavagna conta com um forte candidato para a sucessão. Ele é o ex-presidente do Banco Central, Mario Blejer, ex-funcionário do FMI e atual diretor do Banco da Inglaterra.

DE EX-VICE A CHANCELER - Informações extra-oficiais indicam que o ex-vice-presidente Carlos "Chacho" Álvarez seria o sucessor de Rafael Bielsa no comando da Chancelaria. Bielsa deixará o cargo nos próximos meses, pois foi escolhido por Kirchner para ser a "cabeça" da lista de deputados por seu partido na cidade de Buenos Aires. Desde o início do governo Kirchner acreditava-se que em uma eventual saída de Bielsa,o posto seria ocupado por Lavagna.

Mas, diante dos confrontos de Lavagna com integrantes do gabinete, "El Pingüino" teria optado por uma figura mais alinhada, neste caso, Álvarez.

Ontem, Bielsa afirmou que não tinha informações de que Kirchner pretendesse colocar Álvarez no posto. No entanto, entusiasmado, sustentou que o ex-vice-presidente é "um cara extraordinário".

Álvarez foi o fundador da Frepaso, uma dissidência centro-esquerdista do Peronismo que ao longo dos anos 90 cresceu até tornar-se a terceira força política do país. Em 1999 foi eleito vice-presidente na chapa com o candidato presidencial Fernando De la Rúa, da União Cívica Radical (UCR), de centro. Mas, a convivência da Frepaso com a UCR, na coalizão "Aliança", não funcionou. Após denunciar casos de corrupção no Senado, Álvarez renunciou. Sua saída, sem grandes explicações, causou uma disparada do índice do risco do país, debilitou o governo De la Rúa, e levou à fuga de capitais e à explosão da crise financeira de dezembro de 2001. Enquanto isso, sem seu líder, a Frepaso praticamente desapareceu. Todo o poder político acumulado pelo ex-vice diluiu-se.

Embora atualmente desprestigiado como articulador político, Álvarez possui uma forte imagem de "honesto". No ano passado, foi um dos nomes especulados para ocupar a presidência da Cepal. Mas, foi derrotado por seu conterrâneo e antigo colega de gabinete De la Rúa, o ex-ministro da Economia José Luis Machinea.