Título: Diretor da Abin chama membros da CPI de 'bestas-feras' e é demitido
Autor: Tânia Monteiro
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/07/2005, Nacional, p. A4

Uma mensagem divulgada pela rede interna de computadores custou o cargo ao diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Mauro Marcelo de Lima e Silva. No e-mail dirigido aos subordinados, ele reclama da convocação de um agente para depor na CPI dos Correios e compara os parlamentares que integram a comissão a "bestas-feras em pleno picadeiro". O texto acabou sendo copiado e divulgado na tarde de ontem no Congresso, onde provocou reações iradas. À noite, o Palácio do Planalto anunciou a demissão de Mauro Marcelo. O motivo da irritação do diretor da Abin foi o depoimento do agente Edgar Lange à CPI, na terça-feira da semana passada. A avaliação de Mauro Marcelo é de que a exposição pública do agente causou prejuízos ao trabalho da Abin, baseado muitas vezes em procedimentos sigilosos. O curioso é que o diretor da Abin na semana passada estava em férias no exterior, mas mesmo assim pôs a mensagem na rede interna no dia seguinte ao depoimento. No texto, Mauro Marcelo critica a Advocacia-Geral da União (AGU) por não ter se empenhado para impedir a ida de Lange à CPI.

Por volta das 22 horas de ontem, ao chegar ao Planalto para sua reunião de saída, o diretor da Abin lembrou que a mensagem era dirigida exclusivamente aos funcionários da agência. "Não quis ofender nem os deputados nem o Congresso, mas quis dizer que ele (Lange) foi humilhado e submetido à execração pública. Não era para ofender ninguém." Mauro Marcelo ainda tentou explicar o sentido das palavras que causaram a revolta de deputados e senadores: "Se for procurar no dicionário Houaiss, besta-fera é uma situação humilhante e picadeiro é o palco onde ele foi exposto."

A divulgação da mensagem do diretor da Abin mobilizou imediatamente a cúpula do Congresso e do governo. O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), chegou a ligar para o Planalto para pedir a cabeça de Mauro Marcelo. Ele afirmou que o diretor da agência de inteligência seria prontamente demitido se fosse servidor da Casa e chamou-o de "destrambelhado". O chefe do Gabinete de Segurança Institucional, general Jorge Armando Félix, a quem está subordinada a Abin, reuniu-se com o presidente da República em exercício, José Alencar. Por telefone, eles entraram em contato com o presidente Lula, que está em Paris.

PORTAS FECHADAS

No governo, há quem considere procedente a preocupação de Mauro Marcelo. O próprio Félix tentou negociar com a CPI o depoimento a portas fechadas. Mas avalia-se que Mauro Marcelo perdeu a razão ao enviar a mensagem para os 1.700 funcionários da Abin, correndo o risco de ver as críticas divulgadas para um público mais amplo.

O presidente da Associação dos Servidores da Abin, Nery Kluve, defendeu Mauro Marcelo. Disse que a convocação de Lange para depor "causou comoção e indignação" nos 380 agentes que trabalham em campo. "Ele agora está queimado para o trabalho e terá de ficar na geladeira porque foi completamente exposto, o que é um absurdo", disse. "Se cada agente que sair para um trabalho tiver de dar explicações no Congresso é mais fácil fechar a Abin."

Por volta das 23 horas, o GSI divulgou nota informando que Mauro Marcelo apresentou ontem pedido de demissão, "alegando razões pessoais", a Alencar, que aceitou. A Abin avisa que o atual diretor-geral-adjunto, José Nilton Campana, assume o cargo interinamente.