Título: FHC inveja sucesso de Lula, diz 'Figaro'
Autor: Cida Fontes
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/07/2005, Nacional, p. A10

Entre tantos artigos que, nos últimos dias, foram dedicados ao Brasil pela imprensa francesa, coube ao conservador Le Figaro publicar aquele que, certamente, mais agradará ao governo e à platéia petista. "O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que não engole o sucesso de Lula no cenário internacional, achou bom aconselhá-lo a não se candidatar à reeleição, para que buscasse uma saída honrosa", diz no diário francês a jornalista Lamia Oualalu. "É pouco provável", prossegue a autora, "que a oposição (brasileira) tente um processo de destituição contra o chefe de Estado. Ela se prejudicaria frente à opinião pública, diante da qual Lula continua popular". Segundo a jornalista, deixar o vice-presidente José Alencar completar o mandato "poderia ser um erro tático (dos tucanos)", pois este, conhecido por suas críticas ao modelo econômico, "poderia revelar-se bem menos maleável do que um Lula enfraquecido".

A avaliação dos sentimentos de FHC a respeito de seu sucessor aparece numa análise sobre a crise vivida pelo governo e pelo PT desde as denúncias do deputado Roberto Jefferson. A conclusão da jornalista é que, hoje, muitos eleitores acreditam que o PT "não vale mais que os outros (partidos)" e que talvez os eleitores não o perdoem (em 2006). E Lula, mesmo que se reeleja, poderá ser um prisioneiro do Congresso: "Dos 98 deputados petistas", arrisca ela, "apenas uns 50 deverão preservar seus mandatos em outubro de 2006".

A comparação entre o presidente anterior e o atual, feita por lideranças políticas e culturais, é bem mais fina e elegante. Lula, para muitos deles, não tem o brilho do intelectual Fernando Henrique Cardoso, mas a autenticidade e a franqueza de um presidente ex-operário, mais preocupado com os problemas sociais de seu país. É o que diz, por exemplo, Jack Lang, ex-ministro da Cultura de François Mitterrand.

O primeiro impressionou pelo seu discurso na Assembléia Nacional Francesa, mas Lula conquistou com sua simplicidade a classe política francesa, à direita e à esquerda. O primeiro, como antigo professor em Nanterre nos tempos da ditadura brasileira. O segundo, como antigo sindicalista próximo à CFDT, uma das grandes centrais sindicais francesas.

O próprio Lula, no seu improviso de ontem, no Palácio do Eliseu, onde foi recebido pelo presidente Jacques Chirac, falou de sua proximidade com a França e recordou: "Quando venci as eleições, aqui estive como presidente eleito e fiquei imaginando qual seria minha relação com o presidente Chirac, sua ajuda a um desenvolvimento mais adaptado ao mundo de amanhã." Lula está convencido, hoje, de que Chirac é um verdadeiro homem de Estado, pois ele foi o primeiro entre os líderes dos países desenvolvidos a assimilar a causa da luta contra a fome. E Chirac está convencido de que o projeto franco-brasileiro contra a fome e a miséria, apoiado por cerca de 50 chefes de Estado, deve avançar bastante a partir de setembro, com a Assembléia da ONU em Nova York. Ontem, na recepção pelo 14 de Julho, uma fonte francesa revelou que o país deve reafirmar nas próximas horas, por meio de Chirac, sua posição de apoio à candidatura do Brasil a uma cadeira no Conselho de Segurança das Nações Unidas.

A recepção do 14 de Julho é uma oferecida todos os anos, pelo presidente da França, nos jardins do Palácio do Eliseu a cerca de 5 mil pessoas de diferentes regiões, com suas diferentes gastronomias.

Este ano, em homenagem ao Brasil, uma barraca brasileira serviu carne de uma famosa churrascaria de São Paulo, frutas e doces brasileiros. Duas baianas, vestidas com as cores do Brasil e da França, distribuíram fitinhas amarelas do Bonfim, até para Chirac, sua mulher, Bernadette, e para o casal presidencial brasileiro.