Título: Pelas cédulas, dinheiro não era dízimo
Autor: Vannildo Mendes
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/07/2005, Nacional, p. A7

Ao fazer a recontagem do dinheiro apreendido na segunda-feira em poder do deputado João Batista Ramos da Silva (ex-PFL-SP), bispo da Igreja Universal, a Caixa Econômica Federal fez duas descobertas importantes. Primeiro, que havia cédulas falsas em uma das sete malas. Segundo, que em um maço de R$ 2 mil, com cédulas de R$ 100,00, os números eram em seqüência. Isso poderia ser um indício de que o dinheiro seja proveniente de banco e não de dízimo de fiéis. O valor total apreendido, de R$ 10,2 milhões, foi depositado pela Polícia Federal em uma conta bloqueada na Caixa onde ficará à disposição da Justiça. Antes que esse trabalho fosse feito, advogados de João Batista tentaram obter, no Supremo Tribunal Federal, a liberação do dinheiro, que havia sido apreendido pela Polícia Federal na última segunda-feira, no aeroporto de Brasília. A alegação apresentada foi que não há, na legislação brasileira, nada que proíba alguém de transportar valores. Alem disso, tratava-se de dízimos pagos pelos fiéis da Igreja Universal. A manobra não foi bem sucedida: a vice-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Ellen Gracie, arquivou o mandado de segurança, sob o argumento de que o STF não tem competência para analisar mandados de segurança contra atos da Polícia Federal.

FLAGRANTE

O dinheiro foi apreendido pela PF em uma operação no hangar da TAM, no aeroporto de Brasília, e João Batista apressou-se a dizer que se tratava de dízimos arrecadados pela Igreja Universal. Além dele foram detidas mais seis pessoas - e assim que o episódio foi divulgado outros parlamentares do PFL marcaram uma reunião do partido, no Congresso, para avaliar a situação. Acusado de praticar atos estranhos à vida parlamentar, o deputado foi expulso do partido.

O caso foi descoberto pela PF quando o avião da TAM preparava-se para decolar, às 10h30 da manhã da segunda-feira. Policiais do Grupo de Operações Especiais da PF interromperam a manobra e entraram no aparelho, que procedia de Manaus, depois tinha passado por Belém e de Brasília decolaria para Goiânia. Passageiros e bagagens foram todos retirados do avião. Ao abrir uma das malas, os policiais perceberam o dinheiro, separado em notas de R$10, R$20, R$ 50 e R$100. Eram tantas notas que foi preciso pedir ao Banco Central máquinas contadoras de dinheiro, para agilizar a operação. O trabalho foi tanto que duas delas quebraram.

Pouco depois, enquanto os policiais ouviam os detidos e começavam a contar as cédulas, do lado de fora da Superintendência da PF outros agentes fizeram uma rápida operação para deter onze homens armados que circulavam no pátio do edifício - eram todos PMs armados que faziam segurança para a Igreja Universal.

No Senado, um dos mais importantes defensores da bancada evangélica, o senador Marcelo Crivella (PL-SP), entrou em defesa de João Batista Ramos da Silva. "É tudo dinheiro de doação, não tem nada a ver com dinheiro transportado na cueca, nada a ver com corrupção", disse ele, explicando que as malas traziam dízimos arrecadados em Manaus, no fim de semana anterior, onde vários templos comemoraram os 28 anos de existência da Igreja Universal. Crivella explicou também que tudo estava sendo transportado em malas porque os bancos recusam fazer depósitos elevados quando se apresentam notas pequenas, de R$5 ou R$10. "Assim, é mais racional fazer o transporte em espécie até São Paulo", acrescentou. Da central paulista os recursos seriam distribuídos, segundo ele, para os cerca de 7.500 templos da Universal em todo o País, principalmente para o pafgamento de aluguéis.

PRESIDENTE

Como presidente da Igreja Universal, João Batista Ramos é figura central nas operações financeiras da igreja. Já foi diretor-presidente de três emissoras de TV - Record, Rede Família e Rede Mulher e tem patrimônio declarado, na Receita Federal, de R$ 1,5 milhão.

Esse dinheiro está, basicamente, em duas empresas em que aparece como sócio, a LM Consultoria e a Novo Turismo. No PFL, ao qual aderiu em 2001, João Batista relacionava-se pouco com os demais parlamentares. Com 121 mil votos, passou a compor, com outros 20 parlamentares, a bancada evangélica da Câmara.