Título: Já são 34 os biomas ameaçados
Autor: Herton Escobar
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/07/2005, Vida&, p. A16

O número de regiões do planeta com necessidade urgente de proteção ambiental está aumentando, segundo um novo levantamento feito pela organização Conservação Internacional (CI). A lista de biomas classificados como hotspots - ou "pontos quentes", em inglês - aumentou de 25 para 34 desde a primeira publicação do estudo, cinco anos atrás. Novas áreas emergenciais foram identificadas em quase todos os continentes, incluindo as ilhas do Japão e a Cordilheira do Himalaia, onde está o Monte Everest. Pelo Brasil, continuam na lista o cerrado e a mata atlântica. Os hotspots, segundo o conceito da CI, são biomas com pelo menos 1.500 espécies de plantas endêmicas (ou seja, que só existem naquele lugar) e que já perderam pelo menos 75% de sua cobertura vegetal original - isto é, com alto grau de biodiversidade e alto risco de desaparecer. Desde que o primeiro mapeamento foi publicado, em 2000, essas regiões são consideradas por muitos como as mais ameaçadas do planeta. Juntas, elas abrigam cerca de 75% da biodiversidade mundial de mamíferos, aves e anfíbios.

"As espécies que desaparecerem dessas áreas vão desaparecer globalmente", alerta Gustavo Fonseca, vice-presidente sênior para Ciência da CI e professor do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). O critério de plantas endêmicas, segundo ele, é usado para a classificação porque a diversidade de flora costuma ter relação direta com o resto da biodiversidade de um bioma.

Para o presidente da CI - que tem sede em Washington -, Russel Mittermeier, os hotspots representam "prontos-socorros" da biodiversidade, nos quais a proteção localizada das espécies pode trazer o maior benefício em escala global. E é neles, portanto, que os esforços de conservação devem ser concentrados a curto prazo.

A inclusão de mais nove regiões na lista, segundo Fonseca, é resultado de um aperfeiçoamento do estudo publicado em 2000, que foi capa da revista científica Nature. Todas já chamavam a atenção desde o início, mas ainda faltavam dados suficientes para o selo de hotspot. "Percebemos que algumas áreas eram quase candidatas, mas os números não batiam muito bem, ou havia muito pouca informação."

Cerca de 400 especialistas trabalharam nos últimos quatro anos para atualizar os dados. Fonseca, entretanto, acha que é cedo para dizer se a classificação trouxe alguma melhora para as regiões ameaçadas. "Quatro anos é muito pouco para detectar grandes tendências", diz. "Mas a idéia é que a informação leva à ação. Ou pelo menos é o que esperamos."

BRASIL

A mata atlântica brasileira, reduzida a 7% de sua cobertura original, ainda é considerada um dos biomas mais ameaçados do planeta. Mas uma tendência positiva desponta no horizonte. "O desmatamento tem diminuído bastante, comparado ao ritmo das décadas de 80 e 90", diz o diretor da CI para a mata atlântica, Luiz Paulo Pinto. "Dificilmente você vê desmatamento em larga escala. Hoje ele ocorre em uma escala mais micro, tipo trabalho de formiguinha, corroendo a floresta lentamente pelas bordas."

A diferença, segundo ele, deve-se a vários fatores. Entre eles, uma maior conscientização da população e dos proprietários privados, que detêm mais de 95% das áreas remanescentes de floresta. A mata atlântica tem cerca de 8 mil espécies endêmicas de plantas e abriga mais da metade das espécies de fauna ameaçadas do Brasil.

Para o cerrado, as notícias não são tão animadoras. "O estado de proteção melhorou um pouco, mas o bioma continua sendo a menina dos olhos do agronegócio", diz o diretor da organização para o cerrado, Ricardo Machado. "Não somos contra o agronegócio - realmente, é um trunfo que o Brasil tem nesse setor. O problema é a maneira como isso está sendo feito." Segundo ele, o bioma tem entre 4 mil e 5 mil espécies endêmicas de plantas e já perdeu entre 70% e 80% de sua cobertura.

A Amazônia, apesar de toda sua biodiversidade, não entra na lista porque ainda possui a maior parte de seu território intacto (cerca de 85%). Segundo Fonseca, entretanto, não está descartada a possibilidade de, no futuro, regiões de biodiversidade endêmica da floresta que estejam ameaçadas pelo "arco do desmatamento" venham a ser consideradas hotspots.

O livro Hotspots Revisited (Hotspots Revisitados) será lançado hoje em Brasília, na reunião anual da Sociedade para Biologia da Conservação.