Título: PT arrecadou em 2004 o dobro do que declarou
Autor: Guilherme Evelin
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/07/2005, Nacional, p. A4

O caixa 2 levantado por Delúbio Soares, ex-tesoureiro do PT, com as supostas operações de empréstimos feitas pelo empresário Marcos Valério Fernandes de Souza praticamente iguala a contabilidade oficial dos candidatos do partido nas capitaissucedida campanha rumo ao Palácio do Planalto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2002, na qual Delúbio diz não ter havido caixa 2 por causa da abundância de doadores interessados em contribuir oficialmente, o PT declarou a arrecadação de R$ 21 milhões. SISTEMA FALHO

"São números intrigantes, mas não surpreendentes", diz o advogado Torquato Jardim, ex-ministro do TSE entre 1992 e 1996. "O caixa 2 é inerente ao sistema". Para os especialistas, as lacunas da legislação eleitoral e a falta da aplicação de sanções rigorosas aos partidos políticos infratores ajudam a explicar a disseminação das contabilidades paralelas nas campanhas eleitorais. Outra razão para a proliferação dos caixas clandestinos é o fato de que a lei eleitoral é redigida por políticos, os próprios interessados em burlá-la. "Contribuinte não faz lei tributária. Bandido não faz lei penal. Mas o candidato faz a lei eleitoral. Com um detalhe importante: não é crime ter as contas de candidato rejeitadas pela Justiça Eleitoral", lembra Torquato Jardim.

Por ter confessado o caixa 2, Delúbio colocou os candidatos do PT sob o risco de serem enquadrados no crime de falsidade ideológica, previsto no Código Eleitoral, afirma Torquato. Quem apresenta documentos públicos ou privados manipulados à Justiça Eleitoral está sujeito a penas de reclusão de três a cinco anos. Mas, na prática, quando são flagrados com prestações de contas fajutas, os candidatos se limitam a apresentar retificações e a pagar multas irrisórias, diz o advogado Dinailton Oliveira, também especialista em assuntos eleitorais e presidente da seção da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) na Bahia. "Não há sanção alguma. Quando o partido tem as contas eleitorais rejeitadas, a máxima punição que ele pega é a suspensão dos repasses do fundo partidário, o que não representa nada", diz Oliveira.

FISCALIZAÇÃO

Ele sugere a elaboração de uma legislação permanente para as eleições, assim como o fim da rotatividade nas composições dos tribunais eleitorais para inibir o caixa 2. Mas a idéia de mudanças na lei não agrada a todos. "Não é a lei que resolve. Nós já as temos em excesso", afirma Torquato. Para o ex-ministro do TSE, uma providência mais urgente seria equipar os tribunais eleitorais de instrumentos de fiscalização das campanhas, como a criação de equipes de inteligência para monitorar os gastos dos candidatos, que, geralmente, se concentram em cinco itens: combustível, papel, malharia, locação de automóveis e outdoors.

Um ministro do TSE, que prefere não se identificar, avalia, porém, que a única arma eficiente para combater as contabilidades clandestinas seria uma diminuição drástica dos custos das campanhas políticas. " Se não encontrarmos uma fórmula para reduzir os gastos com a propaganda na TV, que hoje consome a maior parte dos orçamentos dos candidatos, o caixa 2 não vai acabar", diz o ministro.